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quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Não incidência de IR sobre juros moratórios

Por Eduardo Borges e Leonardo Andrade
Recentemente, a 1ª Seção do STJ produziu três importantes precedentes sobre a tributação dos juros moratórios: (i) em 28 de setembro do ano passado decidiu-se que não incidiria "Imposto de Renda sobre os juros moratórios legais em decorrência de sua natureza e função indenizatória ampla" (Resp 1.227.133); (ii) em 23 de novembro do mesmo ano, o precedente acima mencionado foi ajustado, de modo a esclarecer que aquela decisão se aplicaria apenas para os "juros moratórios legais vinculados a verbas trabalhistas reconhecidas em decisão judicial" (EDcl no Resp 1.1227.133); e, por fim, (iii) em 10 de outubro deste ano, decidiu-se que a regra geral, em matéria trabalhista (art. 16 da Lei nº 4.506, de 1964), seria a incidência do Imposto de Renda sobre os juros de mora (Resp 1089720).
Com base nesses precedentes, a mídia e algumas decisões de 1ª instância têm noticiado que o STJ teria definido, como regra geral, a incidência do imposto de renda sobre juros moratórios. No entanto, esse entendimento deve ser analisado com cautela, não podendo ser estendido para todas as espécies de juros.
Primeiramente, porque, nesses precedentes, o STJ examinou tão somente os juros fixados por decisão em processo trabalhista. Quanto à matéria trabalhista, há lei tributária (parágrafo único do art. 16 da Lei nº 4.506, de 1964) que determina a tributação, pelo Imposto de Renda, dos juros moratórios como se eles fossem rendimento do trabalho. Por outro lado, com relação às demais espécies de juros (juros previstos em contratos e juros utilizados na atualização de créditos tributários, por exemplo), não há lei tributária específica nesse sentido.
Na ausência dessa lei, cabe estudar a natureza jurídica de cada espécie de juros moratórios, com base na legislação do direito privado, conforme a melhor leitura do artigo 109 do Código Tributário Nacional.
Analisando-se a natureza jurídica dos juros pagos em atraso, em descumprimento de obrigações contratuais, por exemplo, faz-se pertinente o parágrafo único do art. 404 do Código Civil, segundo o qual "Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar".
O STJ examinou somente juros fixados por decisão em processo trabalhista
Esse dispositivo estabeleceu uma presunção legal do caráter indenizatório dos juros previstos em contrato. Essa interpretação decorre da palavra "suplementar" constante desse artigo, na medida em que, se o juiz entender que os juros moratórios são insuficientes para reparar o dano, então ele poderia "suplementar" aquela indenização (juros de mora).
Com isso, a natureza dos juros moratórios contratuais tornou-se independente da natureza da obrigação principal, pois, mesmo que a obrigação principal não tenha natureza de indenização, os juros moratórios correlatos, por presunção legal, o terão.
Essa foi a conclusão do ministro Moreira Alves, eminente civilista que atuou como magistrado por quase três décadas no Supremo Tribunal Federal, em parecer inédito, recentemente proferido, com base na premissa de que, de acordo com o parágrafo único do art. 404 do Código Civil de 2002, os juros moratórios contratuais tem sempre a natureza jurídica de indenização, seja, ou não, esta a do capital sobre que incidem esses juros.
Observa-se que a referida presunção legal não contempla os juros fixados por decisão judicial (objeto dos precedentes do STJ acima mencionados), os quais têm base legal no art. 407 do Código Civil, que versa sobre os chamados "juros legais". Ou seja, além de não ser objeto de lei específica, os juros de mora contratuais têm, de acordo com o Código Civil, natureza distinta dos juros legais, em análise nos precedentes do STJ.
Assim, por força de presunção legal, os juros moratórios contratuais não caracterizam acréscimo patrimonial, conforme previsto no art. 43 do Código Tributário Nacional, e não podem ser objeto de tributação pelo imposto de renda.
Mesmo que a referida presunção legal fosse desconsiderada, ainda assim, tais juros não poderiam ser tributados pelo imposto de renda. Isso porque os juros de mora contratuais servem apenas para recompor o patrimônio do credor, reparando a lesão causada pelo atraso do devedor. Essa lesão decorre da perda das oportunidades negociais surgidas enquanto o pagamento da obrigação não é realizado. Dada a dificuldade de se comprovar, caso a caso, o ocorrência dessa perda, melhor caminho seguiu o Código Civil de 2002, ao fixar tal presunção legal.
Como se vê, essas questões se distanciam bastante do debate, no STJ, relativo à natureza dos juros decorrentes de decisões proferidas em processos trabalhistas, seja pela natureza diferenciada, seja pela sua fundamentação.
Portanto, ainda não está definida, no STJ, a questão da tributação dos juros moratórios contratuais pelo imposto de renda, sendo um grave erro metodológico (olhando-se a parte como se fosse o todo) a utilização dos referidos precedentes judiciais para se examinar a tributação dessa espécie de juros. O equívoco na delimitação da amplitude dessas decisões pode prejudicar - sobretudo, em tempos de regime dos recursos repetitivos - a justa tributação da renda no Brasil.
Eduardo Borges e Leonardo Andrade são respectivamente, sócio e advogado do Prado Borges Advogados.
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
 
Fonte: Valor Econômico, 20 de dezembro de 2012

Só 5% das empresas optam por resolver conflitos fora dos tribunais (Edição Público Lisboa, 19 Dec 2012, Page4)




Só 5% das empresas optam por resolver conflitos fora dos tribunais

Edição Público Lisboa
19 Dec 2012

Em Portugal, apenas 5% das empresas recorrem a meios de resolução alternativa de litígios (mediação, arbitragem ou julgados de paz), optando por resolver os conflitos fora dos tribunais. A fraca utilização destes meios, em que os empresários dizem ver......read more...

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quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

DIREITO DO CONSUMIDOR. CONSUMO INTERMEDIÁRIO. VULNERABILIDADE. FINALISMO APROFUNDADO.

Não ostenta a qualidade de consumidor a pessoa física ou jurídica que não é destinatária fática ou econômica do bem ou serviço, salvo se caracterizada a sua vulnerabilidade frente ao fornecedor. A determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica. Dessa forma, fica excluído da proteção do CDC o consumo intermediário, assim entendido como aquele cujo produto retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (e, portanto, o preço final) de um novo bem ou serviço. Vale dizer, só pode ser considerado consumidor, para fins de tutela pelo CDC, aquele que exaure a função econômica do bem ou serviço, excluindo-o de forma definitiva do mercado de consumo. Todavia, a jurisprudência do STJ, tomando por base o conceito de consumidor por equiparação previsto no art. 29 do CDC, tem evoluído para uma aplicação temperada da teoria finalista frente às pessoas jurídicas, num processo que a doutrina vem denominando “finalismo aprofundado”. Assim, tem se admitido que, em determinadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente de um produto ou serviço possa ser equiparada à condição de consumidora, por apresentar frente ao fornecedor alguma vulnerabilidade, que constitui o princípio-motor da política nacional das relações de consumo, premissa expressamente fixada no art. 4º, I, do CDC, que legitima toda a proteção conferida ao consumidor. A doutrina tradicionalmente aponta a existência de três modalidades de vulnerabilidade: técnica (ausência de conhecimento específico acerca do produto ou serviço objeto de consumo), jurídica (falta de conhecimento jurídico, contábil ou econômico e de seus reflexos na relação de consumo) e fática (situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica do consumidor o coloca em pé de desigualdade frente ao fornecedor). Mais recentemente, tem se incluído também a vulnerabilidade informacional (dados insuficientes sobre o produto ou serviço capazes de influenciar no processo decisório de compra). Além disso, a casuística poderá apresentar novas formas de vulnerabilidade aptas a atrair a incidência do CDC à relação de consumo. Numa relação interempresarial, para além das hipóteses de vulnerabilidade já consagradas pela doutrina e pela jurisprudência, a relação de dependência de uma das partes frente à outra pode, conforme o caso, caracterizar uma vulnerabilidade legitimadora da aplicação do CDC, mitigando os rigores da teoria finalista e autorizando a equiparação da pessoa jurídica compradora à condição de consumidora. Precedentes citados: REsp 1.196.951-PI, DJe 9/4/2012, e REsp 1.027.165-ES, DJe 14/6/2011. REsp 1.195.642-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2012.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O admirável mundo novo do ensino jurídico

Se não estou enganado, todo professor de Direito tem, no mundo atual, um concorrente poderoso: a diversão e o prazer como condição e dever pedagógico. Não por culpa sua, os alunos vêm condicionados pela nova teologia dos novos tempos: o hedonismo. As pessoas aprenderam que têm o direito (e a obrigação) de ser felizes em tudo o que fazem. No trânsito, no dentista, na missa ou culto de sua igreja, numa aula de pilates, ou de Direito Previdenciário, o aluno espera que o seu tempo seja um tempo de prazer e de diversão. Alunos e mesmo nós, professores, estamos hoje absolutamente convencidos de que uma boa aula sobre “as condições da ação”, “as causas de inelegibilidade”, sobre os “impedimentos impedientes”, sobre o “erro de tipo e de proibição”, sobre “a hipótese de incidência tributária”, ou sobre “a inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade”, deve ser igualmente divertida e prazerosa. Se isso não é alcançado, o diagnóstico é um só: faltaram ao professor habilitações pedagógicas.
Já vi em programa da TV Justiça aula de um professor de direito, ao modo dos cursinhos pré-vestibulares, com violão, jogral e tudo. Como ironiza um sábio professor conservador de filosofia, é esse o evangelho dos novos tempos: todos precisamos estar sempre felizes e gostar do que fazemos. Também no ensino jurídico, o Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley já não é um vaticínio distante, pois também aqui a fórmula se encaixa: “E esse - interveio sentenciosamente o Diretor - é o segredo da felicidade e da virtude: amar o que se é obrigado a fazer. Tal é a finalidade de todo o condicionamento: fazer as pessoas amarem o destino social a que não podem escapar”.
Tenho me perguntado sobre o que é ser professor de Direito neste início de novo milênio. Duvido muito que exista algum professor em qualquer faculdade de Direito neste imenso Brasil que, tomando a sério seu ofício, não se faça cotidianamente essa mesma pergunta. Leandro Karnal, esse intelectual iluminado, alerta-nos de que o problema é mais vasto: é de toda a área de Humanidades. “Talvez pela concepção de tempo e uma sensibilidade específica para o social, os professores da área de Humanas parecem muito angustiados com sua atuação[1]”.
No quadro geral das dificuldades, obviamente, a ninguém escapam algumas idiossincrasias históricas, próprias do nosso tempo: dissolução de valores e, consequentemente, a perda de sentido de nosso “estar no mundo”, além de uma evidente profusão de informações e de “verdades” (muitas vezes contraditórias), bem como a consequente impossibilidade de qualquer certeza como ponto de partida (premissa) ou de chegada para algum significado minimamente conclusivo sobre o nosso afazer intelectual. O mundo não poderia ser mais “admirável”.
Nada obstante, muitos professores de Direito se sentiram tentados a fazer algo diferente e se detiveram diante do medo de estar negando ao aluno o que ele, segundo a opinião predominante, de fato precisa e espera, isto é, a boa e velha aula expositiva, que se restringe ao tradicional conteúdo programático, apto a aprovar o aluno num concurso, na prova da Ordem ou no ENADE.
Na verdade, essa hesitação essencial não é um problema apenas das faculdades de Direito. Mesmo pensando na sua disciplina, a História, Leandro Karnal descreve um quadro que, certamente, espelha bem a realidade de todos os professores de Direito que pensaram em alguma transgressão pedagógica: “a boa vontade da mudança esbarra tanto nos vícios tradicionais da escola como na resistência multifacetada de pais, (...) colegas e alunos. O inovador que espera ser saudado messianicamente acaba, com mais freqüência, encontrando comentários como: ‘Para de enrolar e começa a dar aula’[2]. Em síntese, “muitas iniciativas são abortadas porque o renovador não consegue ver ou avaliar o peso extraordinário da tradição. Rompendo abruptamente com ela, corre o risco de perder contato com o real na sala (...). Não rompendo com a tradição, o professor angustia-se com o indescritível rosto de tédio do seu aluno que espelha uma monotonia crescente a cada ano de magistério[3]”.
Em 1985, chamado a refletir sobre a terrível profecia de George Orwell, veiculada no seu famoso romance publicado em 1949 (o mundialmente conhecido 1984), Neil Postman observava ironicamente que, ao manter os olhos em 1984, quando o ano chegou e a profecia não se concretizou, os americanos deram-se o direito de gabarem-se pelo fato de que a sua democracia liberal se mantinha firme: o terror poderia até ter ocorrido em outros lugares, mas eles, os americanos, achavam que podiam regozijar-se, pois não teriam “sido visitados por pesadelos orwellianos (Orwellian nightmares)” [4].
Ao olhar para o nosso mundo, Neil Postman critica nos americanos o fato de terem esquecido que “ao lado da visão sombria de Orwell, havia uma outra - um pouco mais antiga, um pouco menos conhecida, mas igualmente horripilante: o Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley[5]”. Prossegue, então, o autor num confronto do qual claramente não teríamos dúvida em declarar a vitória de Huxley (cito): “Contrariamente à crença comum, mesmo entre as pessoas cultas, Huxley e Orwell não profetizaram a mesma coisa. Orwell adverte-nos de que seremos superados por uma opressão imposta de fora. Enquanto na visão de Huxley, não se precisará de nenhum Big Brother para privar as pessoas de sua autonomia, maturidade e história, (pois) na sua visão, as pessoas irão amar a sua opressão e adorar as tecnologias que anulam (undo) a sua capacidade de pensar. Enquanto Orwell temia aqueles que iriam proibir os livros, Huxley temia o fato de que não haveria razão para proibir um livro, pois não existiria quem quisesse ler um (livro). Orwell temia aqueles que nos privariam de informação. Huxley temia aqueles que nos dariam tanta (informação) que seríamos reduzidos à passividade e ao egoismo. Orwell temia que a verdade fosse escondida (concealed) de nós. Huxley temia que a verdade fosse afogada (drowned) em um mar de irrelevância. Orwell temia que nos transformássemos numa cultura submissa. Huxley temia que nos tornássemos uma cultura banal, em que estivéssemos apenas preocupados com diversão, prazer e trivialidades. (Prossegue) ‘Como Huxley acentuou na edição revisitada de seu Admirável Mundo Novo, os defensores dos direitos civis e os intelectuais que estão sempre em alerta para opor-se à tirania erraram ao não tomar em conta o quase infinito apetite humano para a diversão’. Huxley acrescentou que as pessoas, no 1984 de Orwell, eram controladas pela imposição do sofrimento. No Admirável Mundo Novo, elas são controladas pela administração (inflicting) do prazer. Em resumo, Orwell temia que aquilo que odiamos se transformasse na causa de nossa ruína. Huxley temia que aquilo que nós amamos é que nos levaria à destruição[6]”.
Olhando para o mundo de hoje, é difícil não concordar com a hipótese de Postman de que o mais provável é que Huxley, e não Orwell, estivesse correto. Da mesma forma, é difícil não estar assustado com as condições de possibilidade do ensino jurídico em nosso País. Mas há sempre esperança.
Roberto Campos dizia que o Brasil, para vencer seus desafios, precisava “abandonar a chupeta das utopias e trocá-la pela bigorna da realidade”. Pensando no ensino jurídico brasileiro, não sou tão duro nem acredito como os gregos que o verdadeiro conhecimento só se possa alcançar – como Antígona – com o sofrimento. Vejo nos alunos uma determinação e uma boa vontade permanente em tudo o que fazem. Mas acredito, honestamente, que nem tudo no ensino jurídico (ou qualquer ensino) pode ser um exercício de prazer e diversão. Alguma coisa está reservada ao estudo solitário, na difícil tarefa do aluno de estar só com o objeto (por exemplo: um texto) de seu aprendizado. Não é à toa que Max Weber, no seu maravilhoso “a Ciência como Vocação”, ao final, aproximou o ofício de professor a algum tipo de sacerdócio cuja única virtude, contudo, era a honestidade ou probidade intelectual. E, por isso, advertiu que aqueles que esperam que os professores se tornem “profetas e salvadores”, da mesma forma que a voz que perguntou à sentinela edomita - quando findará a noite? (da história do exílio recolhida das profecias de Isaías), também terão que esperar por mais de dois mil anos.

[1] Leandro Karnal (org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. SP: Contexto, 6 ed., 2012, p. 10.
[2] Leandro Karnal (org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. SP: Contexto, 6 ed., 2012, p. 10.
[3] Leandro Karnal (org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas, p. 10.
[4] Neil Postman. Amusing Ourselves to Death: Public Discourse in the Age of Show Business. Versão Kindle, location 237-245.
[5] Neil Postman. Amusing Ourselves to Death: Public Discourse in the Age of Show Business. Versão Kindle, location 237-245.
[6] Neil Postman. Amusing Ourselves to Death: Public Discourse in the Age of Show Business. Versão Kindle, location 245-254.
Néviton Guedes é desembargador federal do TRF da 1ª Região e doutor em Direito pela Universidade de Coimbra.
Revista Consultor Jurídico, 17 de dezembro de 2012

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Excesso em doações que possa prejudicar herdeiros deve ser avaliado no momento do ato


A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou ação rescisória que pretendia anular julgamento da Terceira Turma, que entendeu válidas as doações feitas ao longo da vida por falecido à sua viúva. Para o autor da rescisória, o excesso de doações deveria ser considerado no momento da abertura da sucessão.

O autor, herdeiro necessário do falecido, argumentava que as sucessivas doações teriam dilapidado o patrimônio e o quinhão a que ele teria direito. Ao final dos 30 anos de convivência e depois da doação de 19 imóveis à esposa, teria restado ao filho do falecido, na partilha, apenas 0,006% do patrimônio original.

Sem provas 

Para o ministro Luis Felipe Salomão, o herdeiro não comprovou a existência de doações que ultrapassassem, no momento em que realizadas, a parcela patrimonial de que o proprietário poderia dispor livremente – isto é, que avançassem sobre a parte do patrimônio que a lei reserva aos descendentes ou ascendentes, considerados herdeiros necessários.

Na decisão da Terceira Turma, atacada pela ação rescisória, o ministro Menezes Direito afirmou que “o argumento da pobreza final, da não existência de bens para os herdeiros necessários quando da abertura da sucessão, não tem força para anular as doações se, no momento em que foram feitas, o patrimônio do doador tinha condições para desqualificar o excesso”.

Literalidade

O relator da rescisória, ministro Salomão, entendeu que tal interpretação não contraria a literalidade nem o espírito da lei quanto ao tema. Dizia o artigo 1.176 do Código Civil de 1916, correspondente ao artigo 549 do atual: “Nula é também a doação quanto à parte que exceder a de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.”

O ministro ainda afirmou que, mesmo que só se pudesse conhecer o patrimônio total do doador após a abertura da sucessão, isso não afastaria a necessidade de o autor demonstrar, nesse momento, que as doações violaram o direito dos herdeiros necessários quando efetuadas.

“O argumento de que a ação apenas seria cabível após a abertura da sucessão não significa que o patrimônio a ser levado em consideração seja o existente no momento do óbito”, concluiu Salomão.

Processo AR 3493

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Fiador responde por juros de mora desde a data de vencimento dos aluguéis não pagos



A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, no caso de inadimplemento de contrato de aluguel e execução do fiador, este é obrigado a suportar os juros de mora desde o vencimento das parcelas não pagas, e não apenas a partir de sua citação.

Seguindo o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a Turma manteve decisão das instâncias ordinárias e negou recurso especial interposto por um fiador condenado a responder pelos aluguéis não quitados na época devida, com juros moratórios desde o vencimento.

O dono do imóvel alugado havia ingressado com ação de despejo por falta de pagamento, cumulada com a cobrança de aluguéis e encargos, requerendo a citação dos fiadores.

Previsão contratual

Para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, existindo cláusula de responsabilidade do fiador até a entrega das chaves, a mera prorrogação do contrato não extingue a fiança. Como o contrato especificava o valor do aluguel e a data de pagamento, os juros moratórios deveriam incidir desde o vencimento de cada parcela, de acordo com o artigo 397 do Código Civil.

Em sua defesa, o fiador alegou que o início da fluência dos juros deveria se dar na citação, e não como entendeu o tribunal estadual. Para ele, na qualidade de fiador, não tinha a obrigação de pagar os aluguéis no vencimento, pois a obrigação seria do locatário, que recebia os documentos para pagamento em sua residência.

Ao analisar o recurso, o ministro Luis Felipe Salomão observou que a questão controvertida consistia em saber se os juros de mora referentes a débito do fiador, relativo a prestações mensais previstas no contrato de locação de imóvel urbano, correm da mesma forma que para o afiançado ou somente a partir da citação.

Devedor subsidiário
O magistrado destacou que, segundo a Súmula 214 do STJ, o fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento com o qual não consentiu e, por razões de equidade, também não pode ser responsável por despesas judiciais antes de sua citação, visto que não lhe foi dada a possibilidade de satisfazer a obrigação que afiançou.

Porém, o ministro lembrou que a fiança não constitui obrigação distinta da contraída pelo afiançado, colocando-se o fiador na condição de devedor subsidiário. Na fiança, afirmou o ministro, o fiador se obriga a satisfazer uma obrigação assumida pelo devedor e, salvo pactuação em contrário, ele assume também os acessórios da obrigação principal.

Para Luis Felipe Salomão, “a mora ex re independe de qualquer ato do credor, como interpelação ou citação, porquanto decorre do próprio inadimplemento de obrigação positiva, líquida e com termo implementado, cuja matriz normativa é o artigo 960, primeira parte, do Código Civil de 1916, reproduzido no Código Civil atual, no caput do artigo 397”.

Razão singela
Diz o artigo 397 que, nessas situações, o inadimplemento da obrigação “constitui de pleno direito em mora o devedor”. O parágrafo único desse artigo estabelece que, “não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial”.

“Assim”, acrescentou o ministro, “em se tratando de mora ex re, aplica-se o antigo e conhecido brocardo dies interpellat pro homine (o termo interpela no lugar do credor). A razão de ser é singela: sendo o devedor sabedor da data em que deve ser adimplida a obrigação líquida, porque decorre do título de crédito, descabe advertência complementar por parte do credor”.

Ele concluiu que, portanto, “havendo obrigação líquida e exigível a determinado termo – desde que não seja daquelas em que a própria lei afasta a constituição de mora automática –, o inadimplemento ocorre no vencimento”.

Salomão observou ainda que o artigo 823 do Código Civil “prevê expressamente que a fiança pode ser em valor inferior ao da obrigação principal e contraída em condições menos onerosas, limitando-se, todavia, ao valor da obrigação principal”. Assim, segundo ele, diante dessa expressa previsão legal, seria possível ao fiador pactuar que a incidência dos juros de mora se desse apenas a partir de sua citação, o que não ocorreu no caso.