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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

El Gobierno, más cerca de aprobar el código civil (La Nación, nov 28 2013, Página1)




El Gobierno, más cerca de aprobar el código civil

La Nación
nov 28 2013

El oficialismo dio ayer las últimas puntadas en el Congreso a dos polémicas iniciativas. Al tiempo que lograba anoche la aprobación en la Cámara de Diputados de la ley que libera al Estado de toda responsabilidad civil cuando un particular pretenda......leia mais...

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quinta-feira, 21 de novembro de 2013

"Todos precisam entender que cumprir o contrato é fundamental"

Entrevista com Bruno M. Salama


Pergunta - Com base na pesquisa 'Citizens vs. Banks - Institutional Driver of Financial Market Litigiousness in Brazil", como o sr. analisa a atuação dos tribunais nos casos de conflitos relativos a contratos de crédito?

Prof. Bruno M. Salama – Errática. Existe grande espaço de incerteza nesses contratos, muito espaço para decisões em diferentes sentidos, o que leva à insegurança jurídica. Isso não quer dizer que a responsabilidade seja exclusivamente do Judiciário, mas sim resultado de um conjunto amplo de fatores.

Pergunta – Que fatores são esses?

Prof. Salama – São fatores estruturais de três espécies: políticos, econômicos e jurídicos. Os políticos têm a ver com a organização dos poderes do Estado. A Constituição de 1988 trouxe o Poder Judiciário da periferia para o centro dessa organização. O Judiciário passou a ser um agente inescapável do processo de construção das políticas públicas, ativo e não apenas reativo, o que o torna alvo de mais demandas e também mais influente.

Pergunta – E o que mais?

Prof. Salama – Existe ainda um fator conjuntural: o Brasil tem desenvolvido políticas de inclusão social baseadas em crédito e consumo, o que traz o custo do dinheiro, o crédito bancário, para o centro do debate político. Por fim, há uma disputa pelo crédito disponível para consumo e investimentos entre os setores privado e público e entre diversas áreas do setor privado. Isso gera mudanças constantes nas regras que estruturam a economia. É uma nova lei hoje, outra amanhã... Não há tempo de se criar jurisprudência e é claro que isto amplia a insegurança e atrai mais conflitos judiciais.

Pergunta – E os fatores econômicos?

Prof. Salama – O dado real é que os juros em geral são altos no Brasil, mesmo com o esforço recente do Banco Central para segurar essa taxa básica, já parcialmente revertido por causa da alta da inflação. Na ponta do tomador de crédito, ainda há taxas superiores a 100% ao ano. Ora, independentemente dos fatores que levem a isso, na nossa tradição jurídica, tanto por bons quanto por maus motivos, não é de se esperar que a Justiça aja de maneira idêntica ao julgar uma ação envolvendo um crédito concedido a juros de 6% ao ano e outro a juros de 60% ao ano. Há uma noção generalizada, e não apenas no Judiciário, de que quando os juros estão tão altos assim é porque há alguma coisa errada. É difícil assim fazer valer um contrato em que a taxa é muito elevada, mesmo que a taxa seja justificável do ponto de vista da estrutura de custos que determinam a taxa cobrada pelo banco. O problema é que se por um lado o Judiciário reage às altas taxas, por outro lado, ao abrir grande espaço para a intervenção nos contratos, o Judiciário acaba também funcionando como um incentivador do conflito e do litígio. Ou seja, por um lado o Judiciário é causador do conflito; e por outro, é vítima. Existem fatores estruturais no Brasil que tornam o crédito caro; isso é uma coisa. E existe também muito espaço para o oportunismo dos devedores; isso é outra.

Pergunta – E quais são os fatores jurídicos?

Prof. Salama – A cultura jurídica que se cristalizou no Brasil após a Constituição de 1988 embute a ideia da funcionalização do direito, isso é, de que o direito deva ser pensado como meio para se atingir fins concretos ligados a objetivos de política pública. Não é exagero, aliás, dizer que hoje no Brasil o lugar comum dos teóricos do direito seja a rejeição ao estudo e às aproximações exclusivamente exegéticas, filológicas e textuais. Nove entre dez estudiosos do direito dirão: o divórcio entre teoria e prática é insuportável, inaceitável, artificioso, esquizofrênico, nocivo, e assim por diante. Isso não é necessariamente ruim. Mas traz dificuldades.
Uma delas é aumentar o espaço para argumentos que possuem um forte caráter político. O exemplo mais claro é o reconhecimento que temos hoje da chamada "força normativa" dos princípios de direito. Na prática, isso quer dizer que o Judiciário pode ancorar seus julgamentos em princípios constitucionais amplos, abrangentes, nos quais com frequência há oposição entre grandes ideias como por exemplo a dignidade da pessoa humana e a segurança das regras específicas sobre determinado tema, como o que está escrito num contrato, por exemplo.

Pergunta – E esse modo de decidir do Judiciário, no caso dos contratos de crédito, contribui, ainda que indiretamente, para o aumento das taxas de juros praticadas pelo mercado?

Prof. Salama – Sim, e isso já está bem demonstrado. Dúvidas sobre a execução das garantias constitucionais e a imprevisibilidade sobre a recuperação do crédito são incluídas no cálculo do chamado spread bancário. Decisões judiciais não são a única causa dos juros altos, mas que contribuem, isto é um fato.

Pergunta – Por que há tanta litigância contra os bancos?

Prof. Salama – Realmente a quantidade é assustadora, quase insana. Há um estudo recente do CNJ mostrando que as instituições financeiras estão envolvidas em quase 13% das novas ações ajuizadas na Justiça Estadual. Embora seja difícil demonstrar o argumento cientificamente, eu acredito que esse número dispara à medida que a decisão do juiz não garante que o contrato será executado. Aqui temos outro capítulo do fenômeno da 'judicialização' da política pública de que se fala hoje, que está se dando no campo da política, da economia, da saúde... Num certo sentido, esse 'empoderamento' da Justiça é reflexo de uma fuga da política no Brasil. Fazer política não é só fazer bondades, anunciar generosos planos de subsídios, assistências e bondades. Fazer política é chegar a compromissos, é perder aqui para ganhar ali. Winston Churchill famosamente disse que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as outras. Por quê? Porque a democracia tem problemas, e um deles é o de que ninguém quer tomar responsabilidade política pelos difíceis compromissos que precisar ser feitos. No Brasil, os conflitos deixam de ser definidos em seus próprios fóruns, como o Legislativo e o Executivo, e desembocam no Judiciário.

Pergunta – No caso dos contratos, é um fenômeno tipicamente brasileiro?

Prof. Salama – Não, a migração de decisões de políticas públicas para o Judiciário é filha do estado de bem-estar social moderno. Mas no Brasil, no setor de crédito, o conflito parece um pouco fora da curva. De fato, em muitos lugares, como nos Estados Unidos, quando há uma grave crise financeira muita coisa vai parar no Judiciário. A diferença é que no Brasil essa questão não é conjuntural, mas sim estrutural. Não precisamos ter quebradeira bancária, maxidesvalorizações cambiais, nada disso: o litígio bancário é hoje simplesmente endêmico.

Pergunta – E como tem sido o papel do Banco Central nesse processo, como agente regulador e fiscalizador?

Prof. Salama – O Banco Central brasileiro está numa armadilha. De um lado, precisa combater a inflação. Por outro, faz parte de um governo que ancora parte de sua política de inclusão social e de crescimento econômico na concessão de crédito. Essa equação não é simples. Mas independentemente disso, o BC poderia fazer mais do que administrar o preço do dinheiro e a política monetária. Seria possível envolver-se ainda mais em iniciativas voltadas à ampliação da transparência do preço do dinheiro para que todas as partes envolvidas nos contratos de crédito e, posteriormente, o Judiciário, quando for chamado a julgar, tenham parâmetros mais seguros para decidir. É bem verdade que o BC já fez bastante, por exemplo, ao definir o custo efetivo total do crédito nos empréstimos imobiliário, mas acho que é possível fazer mais.

Pergunta – Há, então, um vazio institucional?

Prof. Salama – A coisa não é tão simples. O sistema Judiciário brasileiro não está organizado apenas para gerar ordem e previsibilidade. Ele é também parte do jogo, é juiz e jogador. E a dificuldade para se fechar acordos no Congresso acaba transferindo para o Poder Judiciário conflitos que idealmente seriam do campo da política.

Pergunta – Quais as recomendações para reduzir o nível dos conflitos?

Prof. Salama – Não existe um remédio fácil. Não se resolverá completamente os problemas do litígio endêmico no mercado de crédito no Brasil enquanto não se resolverem problemas estruturais do país ligados ao aumento da taxa de poupança e investimento. O governo, inclusive, sabe disso, e alguns de seus expoentes tratam do tema abertamente na imprensa. Mas tudo isso está no plano dos compromissos políticos, que são duvidosos e difíceis.
Uma coisa, no entanto, é certa: não teremos nunca um mercado de crédito normalizado enquanto a regra geral for o descumprimento dos contratos. Todos precisam entender que cumprir o contrato é fundamental. Adotar uma política aberta e sistematicamente pró-devedor pode ter consequências desastrosas. Não resolvemos o problema da hiperinflação com congelamentos, e não vamos resolver os problemas do mercado de crédito apenas empunhando o Código de Defesa de Consumidor. Qualquer sistema que sinalize que é fácil rever o que foi acordado, vai sempre ampliar os litígios. (José Marcio Mendonça)
 

Direito do Consumidor nacional evolui como francês

A Corte de Cassação francesa é um dos tribunais mais famosos do mundo. Encontram-se referências a seus julgados em quase todos os tratados e manuais de Direito Civil e de Direito Comercial, embora a corte também exerça competência sobre o Direito Penal e o Direito do Trabalho. Legitima sucessora do "Parlamento de Paris", ganhou o nome de "Tribunal de Cassação", nos termos da lei de 27 de novembro-1o de dezembro de 1790. Com Napoleão Bonaparte, em 1804, recebeu a denominação histórica de "Corte de Cassação" e converteu-se na mais alta jurisdição ordinária francesa nas matérias civis, comerciais, laborais e criminais. A concepção de um tribunal com poderes cassatórios espalhou-se pela Europa, juntamente com as tropas napoleônicas. Luxemburgo, Bélgica e Itália possuem cortes com perfil semelhante à Cour de Cassation francesa.

A Corte de Cassação divide-se em: a) uma Câmara Criminal (Chambre criminelle - "Crim.") b) uma Câmara Trabalhista (Chambre sociale – "Soc."); c) uma Câmara Comercial (Chambre commerciale -"Com."); d) três Câmaras Civis (Première chambre civile – "Civ. 1re"); Deuxième chambre civile ("Civ. 2e"); Troisième chambre civile ("Civ. 3e"), assim especializadas: i) direitos pessoais, de família e dos contratos; ii) responsabilidade civil e seguridade social; iii) Direito Imobiliário e da construção. A Corte pode funcionar ainda com "câmaras mistas". "Primeiro Presidente da Corte de Cassação" é a maior autoridade da Corte e também referido elegante e solenemente como o "primeiro magistrado de França". Sua escolha é atribuída ao presidente da República Francesa, de entre os juízes indicados pelo Conselho Superior da Magistratura.

Os franceses consideram que a Cassação é um tribunal de teses e não de fatos. Sua finalidade é estabelecer uma interpretação uniforme do direito ordinário para todo o território nacional, de modo a permitir que um súdito da República Francesa tenha sua vida, sua liberdade e seus bens considerados sob a óptica igualitária, um dos primados ainda hoje enaltecidos daquela sociedade. As decisões do tribunal tem fundamentos extremamente sucintos, o que é bem diverso da exaustiva fundamentação que hoje se encontra nos julgados brasileiros. Fala-se inclusive em uma "arte de interpretar os acórdãos da Cassação".

No Direito Civil, a Corte de Cassação tem acórdãos históricos. A partir dos anos 1970-1980, esse tribunal mudou sensivelmente sua orientação nos casos envolvendo o Direito dos Contratos e passou a adotar uma postura mais favorável à proteção das partes mais fracas nas relações obrigacionais. É muito importante salientar essa mudança, pois, na segunda metade do século XIX e no início do século XX, a Corte de Cassação e o Conselho de Estado francês ocuparam polos antagônicos no debate sobre a revisão dos contratos.

Como já se teve a oportunidade de destacar alhures, os primeiros julgados sobre a revisão contratual em França deram-se no Conselho de Estado, como é exemplo o famoso caso do gás de Bordeaux (Compagnie générale d'éclairage de Bordeaux), julgado em 1916, no qual se admitiu a majoração do valor do gás comercializado pela companhia bordalesa, sob o argumento de que a invasão alemã das áreas produtoras de carvão implicou o aumento de 3 vezes do preço desse minério.

Antes disso, no entanto, a Corte de Cassação, em 6 de março de 1876, decidiu o também conhecidíssimo caso do Canal de Craponne, que é considerado um dos mais importantes precedentes de sempre daquele tribunal. A situação de fato era a seguinte: os Marqueses de Galliffet celebrou em 1560 e 1567 um contrato para a Comuna de Pélissanne, que tinha por objeto a manutenção de um canal de irrigação e de abastecimento de água para a comuna. Passados três séculos, o Marquês de Galliffet reajustou o valor do arrendamento, considerando a brutal desvalorização das taxas pagas pelos comunais, que se converteram em ridículas e incompatíveis com os dispêndios do aristocrata. Em primeiro grau, o Senhor de Galliffet obteve ganho de causa, em 1875, no Tribunal de Aix, mas a Corte de Cassação, em um acórdão com fundamento em dois parágrafos, cassou o acórdão local e manteve o contrato em suas base originais, a despeito da alteração das circunstâncias. Segundo os juízes da Corte de Cassação, o art. 1.134 do Código Napoleão assegurava a prevalência e a incolumidade dos pactos, não havendo razões para o juiz colocar-se acima da vontade pretendida pelas partes.[1]

Uma área na qual a Corte de Cassação emprestou grandes serviços ao Direito Privado nos últimos 30 anos foi o Direito do Consumidor. A esse propósito, J. L. Gallet, conselheiro da Corte, elaborou uma completa análise da jurisprudência desse tribunal em matéria de relações de consumido, que foi traduzida (com grande qualidade) por Clarissa Costa de Lima e publicada na Revista de Direito do Consumidor, volume 87, página 13 e seguintes, de maio de 2013, com o título em português "A proteção do consumidor na jurisprudência da Corte de Cassação". É com base nessa resenha da evolução dos julgados da Corte francesa que se desdobrarão os itens abaixo desta coluna:

1) Conceito de consumidor. Um dos problemas que o tribunal de cassação teve de resolver foi o relativo ao conceito de consumidor, o que é algo bastante simétrico ao que hoje enfrenta o Superior Tribunal de Justiça.[2] Segundo o estudo de J. L. Gallet, a Corte de Cassação deu uma interpretação mais ampla ao que seja um consumidor, de modo a açambarcar também as pessoas jurídicas, em face de cláusulas abusivas. No julgado Cass. Civ. 1.ª, 15.03.2005: Bull. Civ. I, n. 136, o tribunal assim se pronunciou:

"Se, segundo a decisão de 22.11.2001 da Corte de Justiça das Comunidades Europeias, a noção de consumidor, no sentido da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, em 05.04.1993, concernente às cláusulas abusivas nos contratos concluídos com os consumidores, visa exclusivamente as pessoas físicas, a noção distinta de não profissional, utilizada pelo legislador francês, não exclui as pessoas jurídicas da proteção contra as cláusulas abusivas". [3]

Essa condição de "consumidor" também foi conferida a: a) um síndico de condomínio e um sindicato de condomínios (Cass. Civ. 1.ª, 01.03.2005: Bull. Civ. I, n. 64); b) uma associação. (Cass. Civ. 1.ª, 27.09.2005: Bull. 2005, I, n. 347). Desse modo, "esta tendência a estender o benefício da proteção além das pessoas jurídicas tem o condão de conduzir a Corte de Cassação a integrar as pessoas jurídicas na noção de consumidor cada vez que o texto aplicável não comporta nenhuma restrição (ex. regulamentação em matéria de venda de viagens ou pacotes: termo 'consumidor')".[4]

2) Consumidor leigo e consumidor esclarecido. No Direito brasileiro, há uma presunção ampla de vulnerabilidade técnica, jurídica e econômica do consumidor, o que torna bem mais simples o tratamento da questão de seu conhecimento dos produtos ou dos serviços adquiridos ou contratado. Ainda de acordo com o conselheiro da Corte de Cassação, nos contratos de crédito, o tribunal criou uma diferenciação entre consumidor leigo e consumidor esclarecido. De tal modo, prestigiou-se o entendimento que "que coloca a cargo do banco uma obrigação de advertência em relação ao consumidor não esclarecido, que consiste em chamar sua atenção sobre os riscos ligados a seu endividamento em relação a sua capacidade financeira (Cass. Ch. Mista, 29.06.2007: Bull. Civ. ch. Mista, n. 7 e 8". De tal sorte que se estabeleceu uma presunção de "que o mutuário não é esclarecido, cabendo ao banco provar que ele o é ou que cumpriu seu dever de advertência". A instituição financeira será tida como exonerada desse dever se o mutuário demonstrou comportamento desleal (Cass. Civ. 1.ª, 30.10.2007: 06-17003).[5]

3) Necessidade de alegação da abusividade da cláusula. O Superior Tribunal de Justiça, após longa polêmica, resolveu a questão da impossibilidade de conhecimento da cláusula abusiva de ofício pelo juiz, ao editar a Súmula 381: "Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas". J. L. Gallet, em seu texto, demonstra que essa é uma matéria bem polêmica em França, especialmente por conta das diretivas da União Europeia e as mudanças legislativas no direito interno. Ele cita algumas decisões da Corte no sentido de que "o desconhecimento das exigências do art. L. 311-9 do Código do Consumo, mesmo de ordem pública, só pode ser alegado na demanda da pessoa protegida por esta disposição; em consequência, viola este texto o juiz que, para denegar a demanda ao mutuante contra o mutuário após uma abertura de crédito, destaca de ofício a regularidade da renovação do crédito ao fim de cada período anual e julga depois que o mutuante não prova ter advertido o mutuário das condições de renovação da abertura de crédito" (Cass. Civ. 1.ª, 16.03.2004: Bull. Civ. I, n. 91)".[6]

No entanto, como o conselheiro da Corte de Cassação anota, em seguida, "esta jurisprudência estava baseada tanto numa preocupação de neutralidade do juiz quanto no princípio dispositivo, mas não poderá ser mantida". Tal se deve em razão "novo art. L. 141-4 do Código do Consumo, oriundo da Lei de 03.01.2008", que dispõe: "O juiz pode suscitar de ofício todas as disposições do presente Código nos litígios resultantes de sua aplicação".[7]

Esses três pontos, que dizem respeito mais proximamente com a realidade brasileira, demonstram que o Direito do Consumidor nacional tem enfrentado problemas bem similares a seu homólogo francês. E as soluções brasileiras não são inferiores às francesas, seja em seus resultados, seja em sua fundamentação teórica. Uma vantagem do estudo da evolução pretoriana está em se descolar da simples consulta aos textos legais, cuja atualização jurisprudencial pode lhes imprimir um colorido totalmente diferenciado. E é esse um dos papéis mais relevantes do Direito Comparado.

NOTAS

[1] Recomenda-se ao leitor, que está interessado no estudo desses casos e na evolução da jurisprudência (não só francesa) sobre a teoria da imprevisão e a alteração das circunstâncias, a leitura de: RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Revisão judicial dos contratos: autonomia da vontade e teoria da imprevisão. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006. Há também o excelente livro: KHOURI, Paulo R. Roque A. A revisão judicial dos contratos no novo Código Civil, Código do Consumidor e Lei n. 8.666/93 : a onerosidade excessiva superveniente. São Paulo: Atlas, 2006.

 

[2] Para um estudo atualizado desse tema, é também indicada a leitura de: RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz . Um "modelo de revisão contratual por etapas" e a jurisprudência contemporânea do Superior Tribunal de Justiça. In: LOPEZ, Teresa Ancona; LEMOS, Patrícia Faga Iglecias; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. (Org.). Sociedade de risco e Direito Privado: Desafios normativos, consumeristas e ambientais. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2013, v. 1, p. 469-514.

 

[3] GALLET, J. L. A proteção do consumidor na jurisprudência da Corte de Cassação. Traduzido por Clarissa Costa de Lima. Revista de Direito do Consumidor, v. 22, n. 87, p. 13-30, maio/jun. 2013. item I.1.

 

[4] GALLET, J. L. Op. cit. loc. cit.

 

[5] GALLET, J. L. Op. cit. loc. cit.

 

[6] GALLET, J. L. Op. cit. loc. cit.

 

[7] GALLET, J. L. Op. cit. loc. cit.

 

Otavio Luiz Rodrigues Junior é advogado da União, professor doutor de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e doutor em Direito Civil (USP), com estágios pós-doutorais na Universidade de Lisboa e no Max-Planck-Institut für ausländisches und internationales Privatrecht (Hamburgo).

 

Revista Consultor Jurídico, 20 de novembro de 2013

Correção monetária do Plano Verão foi inconstitucional

Os mecanismos de correção monetária do Plano Verão, de 1989, são inconstitucionais. Foi o que decidiu o Supremo Tribunal Federal, por maioria, nesta quarta-feira (20/11), concluindo um julgamento cujo primeiro voto foi proferido em 2001, pelo ministro Marco Aurélio, relator da matéria. Com a decisão, a Fazenda deverá recalcular o índice de correção do Imposto de Renda devido por empresas que foram afetadas pelas regras de correção fixadas no Plano Verão.

A decisão desta quarta está sendo encarada como uma prévia do resultado do julgamento dos planos econômicos, que o Supremo deve julgar no dia 27 de novembro. É nessa data que o STF vai decidir se os planos econômicos dos anos 90 (Collor I e II, Cruzado, Bresser e Verão) foram constitucionais ou não. O que se discute é se devem ser pagas as diferenças apuradas entre os índices de correção da poupança fixados pelos planos econômicos e os índices de inflação da época. Essa diferença são os chamados expurgos inflacionários, que são alvo de quatro recursos extraordinários e uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).

O que foi definido nesta quarta pelo Supremo foi que os índices definidos pelo Plano Verão foram inconstitucionais. Isso porque as leis que definiram as correções para pessoas jurídicas fixaram o índice de correção, chamado de Obrigação do Tesouro Nacional (OTN), em 6,92 cruzados novos, baseadas na inflação oficial de janeiro de 1989, de 44,49%. Era esse o valor que vinha sendo usado pela União para fazer o cálculo da correção monetária do Imposto de Renda devido pelas empresas. O Plano Verão valeu até 1990, quando foi editado o primeiro Plano Collor.

Só que, de acordo com o alegado pelas companhias, a inflação real do período, calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) por meio do IPC, fora de 70,28%, o que levou a OTN a 10,50 cruzados novos.

O efeito prático dessa diferença é que, como a União usava como base de cálculo da correção monetária um índice inflacionário menor do que o real, considerava que as empresas tiveram perdas menores do que as reais. Isso, alegaram, configurou uma situação em que a Fazenda Nacional atribuía aos contribuintes um lucro maior do que o apurado na época.

As empresas, portanto, pediam que, no cálculo do IRPJ e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido, que têm o lucro e a renda como suas bases de cálculo, a partir do ano de 1994, quando veio o Plano Real e amainou a inflação, não fossem considerados os índices fixados pelo Plano Verão.

Vinte e quatro anos

O caso chegou ao Supremo em 1999, portanto já dez anos depois da edição da lei. Veio por causa de uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que declarou constitucionais os índices do Plano Verão. Em 2001, o ministro Marco Aurélio proferiu seu voto.

Marco Aurélio entendeu que, como a União baseava suas contas em um índice inflacionário menor do que o real, passou a considerar que as empresas tiveram ganhos maiores do que os reais. Como, na realidade, os lucros foram menores, a Fazenda, portanto, passaria a tributar o patrimônio dessas empresas. E a tributação do patrimônio é inconstitucional. A correção feita com base na inflação real é a que demonstrará quanto as empresas lucraram entre 1989 e 1994.

A Fazenda sustentou que o Plano Verão é constitucional por obedecer a uma política monetária definida pelo governo. Em parecer enviado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional aos ministros do STF, a União explica que o legislador poderia ter optado pela não indexação da economia, o que faria com que a inflação seguisse as regras do mercado. Mas não o fez, e aprovou os planos de governo sugeridos pelo Executivo por meio de Medidas Provisórias.

Outro argumento levado pela Fazenda é que essa mudança do índice de correção beneficiará as empresas superavitárias, que terão apurado lucro menor do que o considerado pelo fisco federal. Já no caso das empresas deficitárias, aumentando o índice da inflação, aumentam-se também as perdas. O efeito contábil, portanto, será negativo para essas companhias.

Mas o ministro Marco Aurélio foi acompanhado por ampla maioria. Votaram com ele os ministros Cezar Peluso,Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Luis Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Celso de Mello e Joaquim Barbosa. Contra, ficaram Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Luiz Fux. 

Bar exam does not a lawyer make (Baltimore Sun, nov 8 2013, Página21)




Bar exam does not a lawyer make

Baltimore Sun
nov 8 2013

Last week, more than 1,500 people — most of them recent law school graduates — found out whether they passed the Maryland bar examination, a grueling, two-day test designed to assess the taker's readiness to enter the marketplace and become your......leia mais...

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El nuevo Código Civil, a merced de las urgencias kirchneristas (La Nación, nov 14 2013, Página1)




El nuevo Código Civil, a merced de las urgencias kirchneristas

La Nación
nov 14 2013

Cristina Kirchner no necesitará volver a la Casa Rosada para que el sueño napoleónico que confesó en el año 2011 comience a convertirse en realidad. Sus diputados y senadores presentarán hoy, en el Salón Azul del Congreso, el proyecto oficial para......leia mais...

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domingo, 17 de novembro de 2013

A tipologia do exercício abusivo de posições jurídicas

 Por Aldo de Campos Costa

O abuso do direito pode ser conceituado como o desempenho disfuncional de uma certa posição jurídica[1]. Refere-se ao exercício de quaisquer situações jurídicas e não apenas aos de direitos subjetivos[2]. É, ademais, instituto puramente objetivo[3]. Não depende de culpa do agente nem de qualquer elemento subjetivo, muito embora a presença ou a ausência de tais elementos possam, posteriormente, contribuir para a definição das consequências do abuso, que podem ser variadas:  a supressão do direito; a cessação do concreto exercício abusivo; um dever de restituir; um dever de indenizar[4]

A tipologia do abuso de direito compreende atuações contrárias à boa fé que, de início, se apresentam como legítimas. São elas: a) o venire contra factum proprium; b) a inalegabilidade formal; c) a suppressio (supressão); d) o tu quoque e e) o desequilíbrio no exercício[5].

O primeiro tipo de atuação abusiva organiza-se em torno da locução venire contra factum proprium[6]. Estruturalmente, postula duas condutas da mesma pessoa, lícitas em si, mas diferidas no tempo. A primeira — o factum proprium — é contraditada pela segunda — o venire[7]

O venire é positivo quando se traduz numa ação contrária ao que o factum proprium deixaria esperar[8], vale dizer, quando uma pessoa manifesta, em termos não vinculativos, a intenção de não praticar determinado ato e, depois, o pratica[9]. Pode implicar o exercício de direitos potestativos[10], subjetivos comuns[11] ou de liberdades gerais[12]. O venire é negativo quando redunda numaomissão contrária no mesmo factum[13], isto é, quando uma pessoa manifesta, em termos não vinculativos, a intenção de praticar determinado ato e, depois, não o pratica.

Só é proibido em circunstâncias especiais[14]. Explicam-nas duas fundamentações dogmáticas: 1ª) as doutrinas da confiança (Canaris); 2ª) as doutrinas negociais (Weling)[15]. Para as primeiras, o venireseria proibido quando viesse a defrontar inadmissivelmente uma situação de confiança legítima gerada pelo factum proprium[16] , não se podendo atribuir ao comportamento do titular-exercente o sentido de uma declaração negocial, por falta de consciência da declaração[17]. Para as segundas, o agente ficaria vinculado, em termos negociais, pelo factum proprium em questão; ao perpetrar ovenire, estaria a violar a vinculação daí derivada. Prevalecem as doutrinas da confiança[18].

A confiança põe-se entre a boa fé e o caso concreto[19]. Exige que as pessoas sejam protegidas quando, tenham sido, justificadamente, impelidas a acreditar na manutenção de um estado de coisas[20]. Quem confia, legitimamente, não pode ser tratado como se não tivesse confiado, sob pena de olvidar-se o princípio da igualdade: o igual deve ser tratado de modo igual e o diferente de forma diferente[21].

A tutela da confiança só pode operar, na falta de preceitos jurídicos, quando se verificar a reunião de quatro proposições, entre as quais, ressalte-se, não há hierarquia: a) uma situação de confiança; b) uma justificação para essa confiança; c) um investimento de confiança; d) a imputação da confiança[22]. O modelo opera mesmo na ausência de uma ou outra, mas desde que a intensidade assumida pela proposição faltante permitir, valorativamente, compensar a falha[23]

O segundo tipo de atuação abusiva organiza-se em torno da locução inalegabilidade formal. Diz respeito à situação da pessoa que, por exigências do sistema, não pode valer-se da nulidade de um negócio jurídico causada por vício de forma[24]. Revela-se, em princípio, como uma modalidade devenire contra factum proprium: o agente dá ensejo a uma nulidade formal, de molde a prevalecer-se do negócio e a invoca quando resultar-lhe conveniente[25].

A inalegabilidade formal exige a presença de três pressupostos adicionais, considerados os já requisitados para tutelar-se a confiança[26]. Eis a síntese do necessário: 1º) devem estar em jogo tão somente os interesses dos envolvidos; excluindo-se os de terceiros de boa fé; 2º) a situação de confiança deve ser censuravelmente imputável à pessoa a ser responsabilizada; 3°) o investimento de confiança deve ser sensível e dificilmente assegurado por outra via[27]

O terceiro tipo de atuação abusiva organiza-se em torno da locução suppressio (supressão)[28]. Abrange as situações nas quais uma posição jurídica que não tenha sido exercida, em certas circunstâncias e por certo lapso de tempo, não mais possa sê-lo, de outro modo, se contrariar a boa fé[29]. É uma forma de tutela do beneficiário, confiante na inatividade do agente, que vê surgir, na sua esfera, uma nova posição jurídica: a surrectio (surgimento), contraponto da suppressio[30]

Distingue-se do venire, no que o factum proprium é constituído por uma inação não tão clara e óbvia. É prolongado o não-exercício. O quantum exato, entretanto, vê-se determinado pelas circunstâncias do caso concreto. 

O quarto tipo de atuação abusiva organiza-se em torno da locução tu quoque[31]. Exprime a máxima segundo a qual a pessoa que viole uma norma jurídica não pode, depois e sem abuso: a) prevalecer-se da situação jurídica daí decorrente[32]; b) exercer a posição jurídica violada pelo próprio[33]; ou c) exigir de outrem que aceite a situação já violada. 

É instituto que busca efetivar a realidade subjacente, tomando-se como neutro o aspecto formal[34]. Tem aplicação restrita às partes envolvidas[35].

O quinto tipo de atuação abusiva organiza-se em torno da locução desequilíbrio no exercício das posições jurídicas. Constitui um tipo extenso[36] e residual de atuações contrárias à boa fé[37]. Comporta diversos subtipos, a revelar hipóteses em que o titular, embora no exercício de um direito formal, atua de forma atentatória a vetores fundamentais do sistema, despontando como exemplos: a) o exercício danoso inútil, visando apenas provocar danos na esfera de terceiro; b) o dolo agit qui petit quod statim redditurus est, consistente na exigência daquilo que, em seguida, terá de ser restituído;  e c) a grave desproporcionalidade entre a vantagem alcançada pelo titular no exercício do direito e o sacrifício por ele imposto a outrem[38].


[1] Cf. CORDEIRO, Antonio Menezes. Do abuso de direito: estado das questões e perspectivas. In: Revista da Ordem dos Advogados, ano 65, v. 2, set. 2005, p. 15.

[2] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 15.

[3] Vide, a propósito, questão da prova objetiva seletiva do concurso público para o provimento de cargos de juiz federal substituto do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (2011), no qual deu-se como incorreta a seguinte assertiva: a configuração do abuso de direito exige o elemento subjetivo. Confira-se, ainda, questão da prova objetiva seletiva do concurso público para o provimento de cargos de promotor de justiça do Ministério Público do Estado de Roraima (2012), no qual também deu-se como incorreta a seguinte assertiva: determinada pessoa pode exercer um direito contrariando um comportamento anterior próprio, sem necessidade de observância dos elementos constitutivos da boa-fé objetiva.

[4] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 15.

[5] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 1. Vide, a propósito, questão da prova objetiva seletiva do concurso público para provimento de vagas e formação de cadastro de reserva para o cargo de analista da Empresa Brasil de Comunicação (2011), no qual deu-se como correta a seguinte assertiva: O princípio da boa-fé objetiva contratual tem, entre outras funções, a de limitar o exercício de direitos subjetivos, sobre a qual incidem a teoria do adimplemento substancial das obrigações e a teoria dos atos próprios, daí derivando os seguintes institutos: tu quoque, venire contra facutm proprium, surrectio e supressio. Este último assegura a possibilidade de redução do conteúdo obrigacional pactuado, pela inércia qualificada de uma das partes, ao longo da execução do contrato, ao exercer direito ou faculdade, criando para a outra a legítima expectativa de ter havido a renúncia àquela prerrogativa.

[6] Vide, a propósito, questão da prova objetiva do concurso público para provimento de cargos de procurador da Fazenda Nacional (2012), no qual deu-se como correta a seguinte assertiva: a proibição do venire contra factum proprium, corolário do princípio da boa-fé, impede que sejam adotadas posturas contraditórias no processo e constitui lastro para a teorização da preclusão lógica no processo civil.

[7]Cf. CORDEIRO, Antonio Menezes. Da boa fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2007, p. 745. Cita, à página 749, como exemplos: a) o caso de advogado que, de início, estipula, com o constituinte, determinados honorários em montante muito inferior ao prescrito legalmente e para valer em caso de êxito, mas depois, tendo perdido a causa, reclama os honorários legais (acórdão doBundesgerichtshof, de 26 de outubro de 1955); b) o caso de um pai que entrega, em vida, a um filho do primeiro casamento, uma propriedade que tinha em comum com a segunda mulher, da qual tinha vários filhos que, com isso, na altura, concordaram, mas que vêm a impugnar a transmissão, morto o pai, alegando a falta de consentimento formal de todos os interessados (acórdão do Oberster Gericht für die britische Zone, de 2 de dezembro de 1948); c) o caso do diretor de uma sociedade que, não podendo celebrar um contrato com a própria sociedade, o faz mediante convênio através da assembleia geral, que, posteriormente, impugna a deliberação em causa, ante o argumento de que, para o efeito, competente seria o conselho fiscal, não obstante os representantes do órgão implicado participarem todos, sem exceção, daquele (acórdão do Bundesgerichtshof, de 21 de abril de 1960). No tocante à jurisprudência brasileira, podem ser citados como exemplos de proibição de comportamento contraditório, o intento de cobrar-se valores devidos pela incorporada, após expressamente quitar toda e quaisquer dívidas com a incorporadora, por meio de novação da relação contratual havida entre as três (STJ REsp 1.297.847); executado que indica bem à penhora e, posteriormente, invoca a nulidade da adjudicação em razão da impenhorabilidade absoluta do objeto da constrição, por constituir equipamento essencial à continuidade do exercício da profissão (STJ REsp 1.365.418), entre outros.

[8] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 6.

[9] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 6.

[10] É o caso de: a) trabalhador que deixa de demitir-se por oposição de empregador que, um mês após, o despede, alegando o mau estado da empresa (acórdão do Bundesarbeitsgericht, 8 de de junho 1972); b) senhorio que, depois de ter afirmado ao inquilino a possibilidade de ele permanecer no local arrendado até certa data mínima vem, antes dela, rescindir o contrato de arrendamento (acórdão do Arbeitsgericht de Münster, de 21 de março de 1972); c) comprador de veículo que aceita, em negociação, a reparação de certo vício, mas o devolve contra o preço, alegando outro vício adveniente (acórdão do Oberlandersgericht de Colônia, de 8 de novembro de 1972), cf. CORDEIRO,Da boa fé…, p. 747.

[11] É o caso de: a) agente que ao obter mandato em exclusivo declara, na assinatura correspondente, tratar-se apenas de uma formalidade, para, depois, exigir indenização por violação do exclusivo (acórdão do Bundesgerichtshof, de 23 de abril de 1969); b) senhorio que estimula a instalação de uma indústria doméstica no local arrendado e, fundando-se na existência dela, move uma ação de despejo contra o inquilino (acórdão da Relação de Luanda, 17 de julho de 1970), cf. CORDEIRO, Da boa fé…, p. 748.

[12] Cf. CORDEIRO, Da boa fé…, p. 748.

[13] Cf. CORDEIRO, Da boa fé…, p. 747.

[14] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 6.

[15] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 6.

[16] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 7.

[17] Cf. CORDEIRO, Da boa fé…, p. 762; CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 7.

[18] Segundo CORDEIRO, Da boa fé..., p. 761, não se requer culpa, por parte do titular exercente, na ocorrência da contradição, daí ser a doutrina uniforme em tomar a previsão de venire contra factum proprium por meramente objetiva. Vide, a propósito, questão da prova objetiva seletiva do concurso público para o provimento de cargos de juiz federal substituto do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (2009), no qual deu-se como correta a seguinte assertiva: a boa-fé objetiva recomenda a verificação da vontade aparente das partes. Alerta o autor, contudo, para o fato de não ser possível dar-se mais consistência ao factum proprium do que ao próprio negócio jurídico em situações a envolver simulação, reserva mental, falta de seriedade, falta de consciência, coação física, erro, dolo, coação moral, incapacidade acidental ou a atuação de incapaz quando da produção do factum proprium.

[19] O princípio da boa-fé objetiva ecoa por todo o ordenamento jurídico, não se esgotando no campo do direito privado, no qual, originariamente, deita raízes (STJ HC 175217). Daí o esquema de pensamento pressuposto pelo venire contra factum proprium vir sendo transposto para o direito penal. Confira-se com os seguintes casos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: falar-se em reconhecimento de nulidade, decorrente da utilização de prova emprestada para a condenação penal, quando a própria defesa técnica com o seu emprego concordou (HC 216.374); profissional da advocacia que defende, em agravo regimental, tese diametralmente oposta à que defendera em recurso especial (AgR-AREsp 318.341); acusado que tem ciência do processo penal a que responde, sem demonstrar interesse em atualizar sua localização, e que, posteriormente, responsabiliza o Estado pela descoberta de seu paradeiro (AgR-RHC 34.139); juiz singular que não conhece dos embargos de declaração opostos, sob fundamento de que não haveria interesse a ampará-los, porquanto seria reconhecida a prescrição e, posteriormente, em outra decisão, tomada de ofício, afirma que os crimes não estariam prescritos (REsp 1.329.048); profissional da advocacia que durante o intervalo de meses, responde a todas as intimações endereçadas a causídico integrante da sociedade advocatícia que não detinha a prerrogativa de ser comunicado com exclusividade sobre os atos processuais, e que, posteriormente, insurge-se contra estas mesmas intimações irregulares, alegando a impossibilidade de comparecimento a audiência de instrução e julgamento, em face da ausência de comunicação adequada (RMS 33.204).

[20] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 7.

[21] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 7.

[22] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 7.

[23] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 7.

[24] É o caso: a) daquele que cede, por contrato, o uso de escritório e, muito mais tarde, pretende voltar a ele, pelo fato de a cessão não ter obedecido ao formalismo prescrito (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22 de novembro de 1994); b) do locador que embora conhecesse desde o início a situação, invoca a nulidade da locação financeira por vício de forma, não obstante atuasse de modo consentâneo com a validade do contrato (acórdão da Relação de Lisboa, de 31 de março de 1998); c) de quem usa largamente cartão de crédito solicitado através de terceiro a um banco, para vir depois a invocar a nulidade do negócio por ter subjacente um contrato que, contra o disposto na lei, não fora reduzido a escrito (acórdão da Relação de Lisboa, de 4 de março de 1999), cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 8. Em sentido semelhante, confira-se, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, o REsp 1.159.941/SE, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, na Quarta Turma, julgado em 05 de fevereiro de 2013, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 17 de abril de 2013, a envolver o pagamento da retribuição financeira devida pela PETROBRAS a particulares.

[25] Segundo CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 8, "esta simplicidade esconde problemas dogmáticos muito consideráveis. De fato, o negócio que não respeite a forma legal é nulo. Essa nulidade é invocável a todo o tempo e por qualquer interessado, sendo declarável, de ofício, pelo tribunal. Não basta, nestas condições, paralisar a alegação da nulidade pelo agente: seria necessário mexer em profundidade em toda a estrutura das regras formais". Na jurisprudência brasileira, confira-se o REsp 1.040.606/ES, da relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, na Quarta Turma, julgado em 24 de abril de 2012, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 16 de maio de 2012, a envolver hipótese em que a locadora buscava manter o contrato rompido e, ao mesmo tempo, obstar a devolução dos valores desembolsados pela locatária, ante o argumento de que a lei exige forma para conferir validade à avença.

[26] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 8.

[27] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 8.

[28] Cf. CORDEIRO, Da boa fé..., pp. 797-798, propõe o termo suppressio para exprimir a Verwirkungalemã. Sustenta a inadequação das locuções "caducidade", que é a extinção de uma posição jurídica por decurso de um prazo a que esteja sujeita; "exercício inadmissível do direito", com o que se designa na França, em sentido amplo, o abuso de direito; "decadência", com o sentido de caducidade "inibição", que implica uma ideia de não possibilidade transitória de exercício; "paralisação", que associa-se ao funcionar de uma exceção de direito material; "preclusão", que liga-se ao efeito emergente do decurso de prazo invariavelmente determinado; e "perda", que equivale à extinção de um direito; seja por assumirem outros significados técnicos que, aqui, não ocorrem, seja por traduzirem efeitos e não causas. 

[29] Cf. CORDEIRO, Da boa fé..., p. 797. Cita, à p. 822, como exemplos: a) a situação criada numa sociedade que, durante duas décadas, com o acordo unânime de todos os sócios, procedeu a uma distribuição de lucros não correspondente ao contrato social, que só poderia ser alterado com certas formalidades, o que nunca foi feito (acórdão do Bundesgerichtshof, de 17 de janeiro de 1966); b) a situação criada por certa pessoa que, tendo construído uma casa com um empréstimo ao abrigo de regulamentação que só o autorizava vendê-la como habitação própria, a arrendara com obrigação de venda, ao locatário (acórdão do Bundesgerichtshof, de 20 de dezembro de 1971). Na jurisprudência brasileira, confira-se, entre outros, os acórdãos do REsp 1.124.506/RJ, relatado pela ministra Nancy Andrighi na Terceira Turma, julgado em 19 de junho de 2012, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 14 de novembro de 2012 e do REsp 1.190.899/SP, relatado pelo ministro Sidnei Beneti na mesma Turma, julgado em 6 de dezembro de 2011, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 7 de fevereiro de 2012.

[30] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 9. Vide, a propósito, questão da prova objetiva do 23º concurso público de provas e títulos para a Magistratura do Trabalho da 9ª Região (2012), no qual deu-se como correta a seguinte assertiva: Hércules e Aquiles Sociedade de Advogados celebrou com Transportes Dínamo Ltda. contrato de prestação de serviços advocatícios, prevendo o pagamento de prestações mensais de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), reajustáveis a cada 12 meses. Contudo, vigente o ajuste no período compreendido entre novembro de 2002 e outubro de 2008, não houve nenhuma correção no valor das prestações. Após o término do contrato, Hércules e Aquiles Sociedade de Advogados vai a juízo exigindo as diferenças decorrentes do valor das parcelas pagas sem correção monetária. Caracterizou-se a "supressio", que indica a possibilidade de se considerar suprimida determinada obrigação contratual na hipótese em que o não exercício do direito correspondente, pelo credor, gera ao devedor a legítima expectativa de que as disposições iniciais (quanto à correção monetária) não mais seriam exigidas daquela forma inicialmente prevista.

[31] Vide, a propósito, questão da prova objetiva do 23º concurso público de provas e títulos para a Magistratura do Trabalho da 9ª Região (2012), no qual deu-se como incorreta a seguinte assertiva:Hércules e Aquiles Sociedade de Advogados celebrou com Transportes Dínamo Ltda. contrato de prestação de serviços advocatícios, prevendo o pagamento de prestações mensais de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), reajustáveis a cada 12 meses. Contudo, vigente o ajuste no período compreendido entre novembro de 2002 e outubro de 2008, não houve nenhuma correção no valor das prestações. Após o término do contrato, Hércules e Aquiles Sociedade de Advogados vai a juízo exigindo as diferenças decorrentes do valor das parcelas pagas sem correção monetária. Verifica-se, no caso, a regra "tu quoque", visto que na hipótese específica o escritório de advocacia abriu mão do reajuste anual das prestações mensais durante todos os seis anos de vigência do contrato, despertando na empresa contratante, ao longo de toda a relação negocial, a justa expectativa de que a correção não seria exigida retroativamente.

[32] É o caso de: a) parte que, ao perder contrato enviado pela outra, visando a colheita e o reconhecimento da firma, alega a invalidade do pacto ante a ausência de assinatura (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de julho de 2001); b) condomínio que deixa de assinar a ata da assembleia e prevalece-se disso para impugná-la (acórdão da Relação de Lisboa, de 2 de março de 2004), cf. CORDEIRO, Do abuso de direito..., p. 10.

[33] É o caso de locatário que alega um vício da coisa locada de que ele próprio foi causador (acórdão do Reichsgericht, de 30 de maio de 1938), cf. CORDEIRO, Da boa fé…, p. 849. É dado constatar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece, desde há muito, o tu quoque não só nas relações privadas, mas incidente, também, nos vínculos processuais, seja no âmbito do processo administrativo ou judicial, conforme se depreende do estampado no acórdão do RMS 14.908/BA, relatado pelo ministro Humberto Martins na Segunda Turma, julgado em 6 de março de 2007, e veiculado no Diário da Justiça de 20 de março seguinte.

[34] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, pp. 9-10.

[35] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 9.

[36] Cf. CORDEIRO, Da boa fé…, p. 853.

[37] Cf. CORDEIRO, Do abuso de direito…, p. 10.

[38] Cf. CORDEIRO, Da boa fé…, p. 853. A título exemplificativo, cita, em Do abuso de direito…, p. 10, o caso daquele que exige, no âmbito da acessão, uma demolição muito custosa a troco de uma pequena vantagem (acórdão da Relação de Coimbra, de 8 de fevereiro de 2000).

Aldo de Campos Costa exerce o cargo de assessor de ministro do Supremo Tribunal Federal. Foi professor substituto da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 14 de novembro de 2013