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terça-feira, 21 de outubro de 2014

Em países islâmicos, economia e religião se misturam

Proibidas pelo Alcorão, práticas como cobrança de juros e especulação não são aceitas pelos bancos de países islâmicos. Eles também não financiam produção de álcool e de tabaco.


 
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Durante a crise econômica internacional de 2008, as instituições financeiras islâmicas registraram crescimento de dois dígitos.


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No mundo muçulmano, os princípios islâmicos – chamados de Sharia – ultrapassam as decisões pessoais: a religião tem forte influência também na política e na economia. Para adaptar o sistema financeiro ao Alcorão, os bancos localizados nesses países seguem diretrizes diferentes das adotadas no Ocidente. A usura (ou Riba), por exemplo, é proibida. E, em consequência, não é permitido cobrar juro por empréstimo. A alternativa encontrada pelas instituições foi financiar projetos e receber parte dos lucros, como parceiros de negócios. Para muitos, a primeira impressão é de que este modelo estaria fadado ao fracasso. O segmento, entretanto, cresceu em grandes proporções nos últimos anos.

Durante a crise econômica internacional de 2008, as instituições financeiras islâmicas registraram crescimento de dois dígitos. De acordo com o Thomson Reuters Islamic Finance Development Indicator (IFDI), divulgado no início do mês, a taxa de evolução desses bancos foi de 16% entre 2008 e 2012. No final de 2013, as instituições mulçumanas somavam US$ 1,2 trilhões em ativos. "A estimativa é de que esse montante chegue a algo em torno de US$ 3 trilhões até 2018, impulsionado principalmente pelo avanço de mercados da Malásia, Indonésia, Turquia e dos países-membros do Conselho de Cooperação do Golfo (GCC - sigla em inglês)", destaca Emmy Abdul Alim, editora da parte de finanças islâmicas da Thomson Reuters e autora do livro "Global Leaders in Islamic Finance: Industry Milestones and Reflections" ("Líderes Globais em Finanças islâmicas: Marcos da Indústria e Reflexões" em tradução livre).

Os empréstimos pessoais, embora não sejam tão praticados no mundo islâmico, também são feitos sem taxas de juros: o devedor só é obrigado a retornar o montante emprestado. No entanto, o cliente pode, a seu critério, pagar uma quantia extra para além do montante principal do empréstimo (sem prometê-lo), como um sinal de apreço ao credor – o que geralmente ocorre. Taxas operacionais também são, eventualmente, cobradas. No caso de financiamento de veículos e imóveis, os bancos compram o bem e o revendem para o interessado com valor maior, só que parcelado – uma forma de lucrar sem cometer o pecado da usura.

Além da proibição da cobrança de juros, a especulação também não faz parte do sistema. "As transações financeiras e econômicas devem ser apoiadas por ativos reais. Isso significa uma ligação direta entre o sistema bancário islâmico e a economia real, produtiva. Além disso, o sistema financeiro islâmico não pode negociar ou lidar com produtos e atividades que são consideradas inadmissíveis no Islã, como o álcool, tabaco, pornografia e armas", explica a especialista.

O sistema financeiro islâmico é relativamente novo, iniciado na década de 1970. "À época, a indústria, ainda prematura, buscava crescimento e a maioria dos produtos bancários foram réplicas dos convencionais, mas reestruturados para aderir aos princípios islâmicos. À medida que o setor se desenvolveu e ganhou mais confiança, criou-se um crescente apelo para o afastamento dessa abordagem, para abraçar o verdadeiro espírito e a essência dos ensinamentos e valores do Islã", completa Emmy.

Para Faleel Jamaldeen, professor de finanças islâmicas na Effat University, localizada na Arábia Saudita, e autor do livro "Islamic Finance for Dummies" ("Finanças Islâmicas para Leigos" em tradução livre), o segredo do sucesso deste sistema é baseado nos riscos das operações, que são mais baixos que nos bancos convencionais. "Por conta do lucro compartilhado, a ameaça de perdas é bem mais baixa. Além disso, países ricos do Oriente Médio estão apostando nesses bancos", salienta.

Integração
Os bancos islâmicos tem demonstrado lucros consistentes,  o que fez com que bancos tradicionais abrissem as portas para produtos que seguem os princípios da Sharia. Atualmente, existem 411 bancos islâmicos no mundo, de acordo com o IFDI. Desse total, 39% são bancos convencionais que abriram uma janela para produtos adaptados ao Alcorão. Esse sistema pode ser encontrado em 60 países, que operam paralelamente aos bancos tradicionais. "Como os bancos islâmicos reagiram à crise melhor que os convencionais, mostrou-se ao mundo como uma alternativa viável. Há uma movimentação entre economistas para a necessidade de afastamento da forte dependência de operações de transferência de risco com base em dívida, que provocaram a crise. É aí que o sistema mulçumano entra", frisa Emmy, da Thomson Reuters.

"Há muitos países onde os bancos tradicionais implementaram o sistema financeiro islâmico e foram bem sucedidos. O Reino Unido, por exemplo, introduziu o sistema em 2004 e agora existem sete bancos islâmicos operando por lá. A maioria dos países do Oriente Médio, que eram dominados por bancos tradicionais, substituíram por instituições islâmicas por conta da demanda. Países como a Tailândia e Cingapura já introduziram o sistema bancário islâmico", ressalta Faleel.

Marcos Pimenta, do Depef, esteve em um evento sobre finanças islâmicas em maio deste ano, realizado na Malásia, o MNM-MTCP Fundamentals of Islamic Finance. "Este é um modelo novo. Ainda temos muito preconceito com relação às ideias mulçumanas, mas é importante conhecer e estudar um sistema e avaliar porque está crescendo tanto, principalmente porque desperta o interesse de grandes instituições", diz.


Fonte: https://home.intranet.bcb.gov.br/conexao/Paginas/Em-países-islâmicos,-economia-e-religião-se-misturam.aspx#

Em 20/10/2014

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