O Superior Tribunal
de Justiça (STJ) negou a aplicação da teoria da imprevisão a contratos de venda futura de soja
a preço certo, celebrados no início dos
anos 2000 por um produtor rural goiano.
Seguindo voto do
ministro Antonio Carlos Ferreira, a Turma entendeu que a alta no preço do produto, em razão da
variação cambial ocorrida à época, não
tornou o cumprimento do contrato excessivamente oneroso para o produtor; apenas reduziu o lucro que
ele poderia ter obtido, de forma que não
é possível a revisão do contrato pelo Poder Judiciário.
A teoria da imprevisão
é adotada pelo artigo 478 do Código Civil de 2002 e possibilita que uma parte do contrato
seja exonerada de suas obrigações quando
fatos supervenientes, extraordinários e imprevisíveis, tornarem sua prestação muito
onerosa, com vantagem excessiva para a
outra parte.
Alguns casos
semelhantes, envolvendo soja negociada no mercado futuro pelos produtores de Goiás, já foram julgados
no STJ. Os vendedores queriam que o
Judiciário declarasse os contratos nulos, argumentando que a variação cambial ocorrida em 2002, por
conta de eventos como a iminência da
Guerra do Golfo e as eleições presidenciais, elevou as cotações do produto. Não tiveram sucesso.
No caso relatado
pelo ministro Antonio Carlos Ferreira, o produtor rural pretendia a resolução de contratos
celebrados com a empresa Cargil Agrícola
S.A. O pedido foi atendido na primeira e na segunda instância, ao entendimento de que esses
contratos estavam desprovidos do
princípio da boa-fé objetiva e do necessário equilíbrio econômico.
No entanto, segundo a Quarta Turma, a variação cambial que
alterou a cotação da soja não
caracterizou um acontecimento extraordinário e imprevisível. "As partes contratantes conhecem
o mercado em que atuam", disse o
relator, lembrando que são profissionais do ramo e sabem que as flutuações de preço são possíveis
nesse tipo de negócio.
Ao votar a favor do
recurso interposto pela Cargil, o ministro destacou que os
contratos empresariais não podem ser tratados da mesma forma que os contratos
de consumo ou os contratos cíveis em geral, os quais admitem maior dirigismo contratual, com
a conseqüente relativização dos
princípios da autonomia da vontade e da força obrigatória das avenças.
Ele lembrou que o direito civil e o direito empresarial
submetem-se a regras e princípios
próprios, ainda que ambos sejam ramos do direito privado. "O fato de o Código Civil de
2002 ter submetido esses contratos às
mesmas regras gerais não significa que sejam essencialmente iguais", disse o ministro.
"Nos contratos empresariais, dada a
simetria natural que há entre as partes
contratantes, a situação é diferente. Não se pode tratá-los da mesma forma que os demais contratos de direito
privado, tais como os contratos de
trabalho, os contratos de consumo ou mesmo os contratos entre particulares", acrescentou.
O caso analisado
pela Quarta Turma tem peculiaridades que impedem a aplicação da teoria da imprevisão, segundo o
relator. Primeiro, os contratos em
discussão não são de execução continuada ou diferida, mas contratos de venda de
coisa futura, a preço fixo; além disso, a alta do produto não tornou a prestação excessivamente
onerosa para uma das partes, que apenas
deixou de lucrar mais com ela; finalmente, a variação cambial que alterou a cotação da soja
não foi evento extraordinário e
imprevisível no mercado.
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