Por Eduardo Borges e Leonardo Andrade
Recentemente, a 1ª Seção do STJ produziu três importantes precedentes
sobre a tributação dos juros moratórios: (i) em 28 de setembro do ano
passado decidiu-se que não incidiria "Imposto de Renda sobre os juros
moratórios legais em decorrência de sua natureza e função indenizatória
ampla" (Resp 1.227.133); (ii) em 23 de novembro do mesmo ano, o
precedente acima mencionado foi ajustado, de modo a esclarecer que
aquela decisão se aplicaria apenas para os "juros moratórios legais
vinculados a verbas trabalhistas reconhecidas em decisão judicial" (EDcl
no Resp 1.1227.133); e, por fim, (iii) em 10 de outubro deste ano,
decidiu-se que a regra geral, em matéria trabalhista (art. 16 da Lei nº
4.506, de 1964), seria a incidência do Imposto de Renda sobre os juros
de mora (Resp 1089720).
Com base nesses precedentes, a mídia e algumas decisões de 1ª instância
têm noticiado que o STJ teria definido, como regra geral, a incidência
do imposto de renda sobre juros moratórios. No entanto, esse
entendimento deve ser analisado com cautela, não podendo ser estendido
para todas as espécies de juros.
Primeiramente, porque, nesses precedentes, o STJ examinou tão somente
os juros fixados por decisão em processo trabalhista. Quanto à matéria
trabalhista, há lei tributária (parágrafo único do art. 16 da Lei nº
4.506, de 1964) que determina a tributação, pelo Imposto de Renda, dos
juros moratórios como se eles fossem rendimento do trabalho. Por outro
lado, com relação às demais espécies de juros (juros previstos em
contratos e juros utilizados na atualização de créditos tributários, por
exemplo), não há lei tributária específica nesse sentido.
Na ausência dessa lei, cabe estudar a natureza jurídica de cada espécie
de juros moratórios, com base na legislação do direito privado,
conforme a melhor leitura do artigo 109 do Código Tributário Nacional.
Analisando-se a natureza jurídica dos juros pagos em atraso, em
descumprimento de obrigações contratuais, por exemplo, faz-se pertinente
o parágrafo único do art. 404 do Código Civil, segundo o qual "Provado
que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena
convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar".
O STJ examinou somente juros fixados por decisão em processo trabalhista
Esse dispositivo estabeleceu uma presunção legal do caráter
indenizatório dos juros previstos em contrato. Essa interpretação
decorre da palavra "suplementar" constante desse artigo, na medida em
que, se o juiz entender que os juros moratórios são insuficientes para
reparar o dano, então ele poderia "suplementar" aquela indenização
(juros de mora).
Com isso, a natureza dos juros moratórios contratuais tornou-se
independente da natureza da obrigação principal, pois, mesmo que a
obrigação principal não tenha natureza de indenização, os juros
moratórios correlatos, por presunção legal, o terão.
Essa foi a conclusão do ministro Moreira Alves, eminente civilista que
atuou como magistrado por quase três décadas no Supremo Tribunal
Federal, em parecer inédito, recentemente proferido, com base na
premissa de que, de acordo com o parágrafo único do art. 404 do Código
Civil de 2002, os juros moratórios contratuais tem sempre a natureza
jurídica de indenização, seja, ou não, esta a do capital sobre que
incidem esses juros.
Observa-se que a referida presunção legal não contempla os juros
fixados por decisão judicial (objeto dos precedentes do STJ acima
mencionados), os quais têm base legal no art. 407 do Código Civil, que
versa sobre os chamados "juros legais". Ou seja, além de não ser objeto
de lei específica, os juros de mora contratuais têm, de acordo com o
Código Civil, natureza distinta dos juros legais, em análise nos
precedentes do STJ.
Assim, por força de presunção legal, os juros moratórios contratuais
não caracterizam acréscimo patrimonial, conforme previsto no art. 43 do
Código Tributário Nacional, e não podem ser objeto de tributação pelo
imposto de renda.
Mesmo que a referida presunção legal fosse desconsiderada, ainda assim,
tais juros não poderiam ser tributados pelo imposto de renda. Isso
porque os juros de mora contratuais servem apenas para recompor o
patrimônio do credor, reparando a lesão causada pelo atraso do devedor.
Essa lesão decorre da perda das oportunidades negociais surgidas
enquanto o pagamento da obrigação não é realizado. Dada a dificuldade de
se comprovar, caso a caso, o ocorrência dessa perda, melhor caminho
seguiu o Código Civil de 2002, ao fixar tal presunção legal.
Como se vê, essas questões se distanciam bastante do debate, no STJ,
relativo à natureza dos juros decorrentes de decisões proferidas em
processos trabalhistas, seja pela natureza diferenciada, seja pela sua
fundamentação.
Portanto, ainda não está definida, no STJ, a questão da tributação dos
juros moratórios contratuais pelo imposto de renda, sendo um grave erro
metodológico (olhando-se a parte como se fosse o todo) a utilização dos
referidos precedentes judiciais para se examinar a tributação dessa
espécie de juros. O equívoco na delimitação da amplitude dessas decisões
pode prejudicar - sobretudo, em tempos de regime dos recursos
repetitivos - a justa tributação da renda no Brasil.
Eduardo Borges e Leonardo Andrade são respectivamente, sócio e advogado do Prado Borges Advogados.
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor
Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser
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natureza em decorrência do uso dessas informações
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Fonte: Valor Econômico, 20 de dezembro de 2012 |
quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
Não incidência de IR sobre juros moratórios
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