Corria o mês de
Agosto de 2007 quando rebentou, nos EUA, a gigantesca bolha imobiliária
que se tinha vindo a criar, fruto de uma crise no sector imobiliário que
crescia desde 2001, também chamada de crise do subprime.
Os índices da bolsa de Nova Iorque caíram de uma forma estrondosa:
era o início da enorme crise financeira mundial que se alastrou por todo o
sector imobiliário mundial.
É neste contexto que surge o Acórdão da Audiência Provincial de
Navarra que está a ter uma enorme repercussão no sector imobiliário e
bancário em Espanha e Portugal. Esta decisão sustenta que a devolução de
casa ao banco no âmbito de uma execução hipotecária pode saldar o
empréstimo ainda
que o valor da venda do imóvel não ascenda ao total do valor
mutuado.
Em causa estava uma hipoteca ao banco no valor de 78.000,00€ que,
devido a falta de pagamento do empréstimo por vários meses, levou o banco
a accionar um processo de execução para recuperar o crédito ainda em
dívida.
O banco em questão adquiriu o imóvel numa venda judicial por
apenas 48.000,00€ e activou a segunda fase de execução pelo remanescente.
Segundo aquele acórdão, o próprio banco avaliou o imóvel por
valor superior ao do empréstimo, pelo que o risco de perda do valor
imóvel também corria pela entidade bancária e o prosseguimento da execução
por valor remanescente seria moralmente censurável.
Em Portugal, só nos primeiros oito meses de 2011 foram entregues
aos bancos 3900 imóveis por famílias e promotores imobiliários em
resultado de incumprimento do pagamento de créditos à habitação e à
construção, de acordo com dados divulgados pela Associação dos
Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal.
Neste contexto, notícias publicadas na imprensa escrita dão conta
de sete sentenças recentes dos Tribunais de primeira instância portugueses
que terse-ão pronunciado no mesmo sentido do referido acórdão da
Audiência Provincial de Navarra (vide Diário de Notícias, na edição online
de 17 de Junho de 2011).
A entrega da casa ao banco pode saldar efectivamente o crédito
decorrente da aquisição de habitação?
Será que em Portugal este género de decisões poderá vir a
constituir jurisprudência futura?
Salvo situações que representem desvios aos casos padrão,
entendemos que a lei portuguesa não permite que a dívida ao banco para
aquisição de habitação se extinga apenas com a entrega do imóvel.
Desde logo porque é pressuposto da dação em cumprimento (artigo
837º do Código Civil) o assentimento do credor para que a prestação de
coisa diversa exonere o devedor do pagamento das prestações.
A situação será diferente se a avaliação do imóvel, pela
instituição financeira, tiver sido feita de forma negligente e se
considere que esta tinha um dever jurídico de dar informação (art. 485, nº 2,
do CC) e o devedor tenha fundado a sua decisão de comprar na avaliação do
imóvel realizada pelo Banco, ajustando o preço acordado à avaliação
em causa, por exemplo.
A serem confirmadas as decisões de primeira instância agora
divulgadas, as instituições bancárias ficarão directamente expostas às
desvalorizações do mercado imobiliário.
Na situação de extrema fragilidade do sistema económico português
– e das famílias e instituições bancárias em especial -, poucas vezes uma
orientação jurisprudencial poderá ter tanto impacto ao nível económico e social
como aquela que vier a ser adoptada quanto ao caso vertente.
Vamos aguardar com expectativa que os tribunais superiores
portugueses sejam chamados a dirimir estes casos.
FONTE:
http://www.rvr.pt/netimages/file/Publicos/novomodelonewsletterrvr_entregacasabanco.pdf
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