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segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Cláusula penal de confidencialidade

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Valor Econômico. 

Por Alex Vasconcellos Prisco

 

Os acordos de confidencialidade têm por objetivo proteger informações estratégicas das partes envolvidas numa relação negocial, tais como segredos industriais, tecnologias, know-how, planos comerciais etc. A grande potencialidade danosa da violação do dever de sigilo, aliada às naturais dificuldades de apuração efetiva dos respectivos prejuízos, faz com que seja extremamente recomendável a previsão expressa de multa contratual para os casos de infringência da confidencialidade.

Oriundos da "common law", esses pactos são hoje uma realidade consolidada na prática empresarial brasileira, onde estão presentes antes, durante e após todas as contratações cujo desempenho exija o compartilhamento de dados sensíveis, que não podem ser revelados a terceiros nem usados por um contratante em detrimento do outro. É preciso, no entanto, ter especial cuidado na estruturação jurídica da pena convencional nas hipóteses de violação de sigilo, a fim de dar-lhe efetividade perante o sistema jurídico nacional, de matriz romano-germânica.

De acordo com o nosso Código Civil, que regula a matéria nos artigos 408 a 416, a cláusula penal pode ser moratória ou compensatória (art. 409). Nesta, a sanção tem por escopo principal o ressarcimento dos danos causados pelo descumprimento total da obrigação. Naquela, o objetivo essencial é evitar o inadimplemento da prestação, funcionando como reforço da obrigação.

Não é incomum se deparar com cláusulas penais exóticas, fruto do empirismo criativo do mercado - a multa não compensatória

Na hipótese de cláusula penal pela quebra da confidencialidade, a multa será compensatória e funcionará como liquidação antecipada das perdas. Não há como se cogitar de penalidade moratória nessa situação, pois o segredo, uma vez revelado, se esvai para sempre. Essa falta do devedor conduz à completa inutilidade da prestação ao credor, que em tal cenário tem de se contentar com o substitutivo da indenização.

Nos termos do art. 416, para exigir a pena convencional não é necessário alegar prejuízo. Logo, violada a confidencialidade pelo infrator, nasce em favor do lesado a presunção absoluta de dano, a ser reparado exclusivamente com base nos valores pré-determinados na cláusula penal. Essa vantagem é contrabalançada por um limite do conteúdo econômico da sanção que, como regra, não pode ultrapassar o valor da obrigação principal (art. 412), devendo ser reduzido equitativamente pelo juiz se a prestação tiver sido cumprida em parte ou se o montante da pena for excessivo diante da natureza e finalidade do negócio (art. 413). A exceção fica por conta da pactuação textual de indenização suplementar, caso em que a pena vale como indenização mínima e o prejuízo restante deve ser comprovadamente apurado (art. 416, § único).

Apesar disso, não é incomum se deparar aqui com cláusulas penais exóticas, fruto do empirismo criativo do mercado. É a chamada "multa não compensatória", comumente fixada em montante próximo ou maior ao da obrigação principal e cuja incidência não afasta a obrigação da parte infratora em indenizar integralmente os danos. O esquema é de duvidosa juridicidade, vez ue gera enriquecimento sem causa da vítima, autorizando a intervenção judicial no contrato para afastar ou reduzir a penalidade. Equívocos como esses acontecem em função da importação acrítica do instituto da multa contratual, que entre nós não pode ser arbitrada em valor alto, a ponto de predominar um caráter punitivo. Como estratagema negocial, sua estipulação talvez até possa exercer algum poder dissuasório, mas, na realidade jurídica pátria, sanções desse tipo são de difícil execução.

Seja como for, não seria incorreto especular que essa distorção esteja também ligada à inadequação da regra do valor máximo da obrigação principal, em especial no que tange à pena por violação de confidencialidade, onde não raro os danos são maiores que as quantias envolvidas no contrato. É verdade que insuficiências podem ser sanadas pela estipulação expressa de indenização suplementar. Contudo, o processo de mensuração do efetivo prejuízo adicional é longo e custoso na quebra de sigilo, o que acaba com a atratividade da cláusula penal.

Nesse contexto, a multa não compensatória seria uma tentativa legítima dos agentes econômicos de contornar uma falha da legislação. Sensível a essa problemática, há pronunciamento do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), exarado em voto vencido na Apelação nº 9087995-54.2007.8.26.0000, que validou cláusula penal acima da obrigação principal, indo contra a letra da lei. A justificativa foi de que a pena, mesmo estipulada em valor igual ao dobro da prestação do contrato, estava em harmonia com a natureza e finalidade do negócio, cumprindo "dupla função econômico-empresarial: de ressarcimento da contratada e de inibição a atos de violação por parte da contratante".

Percebe-se, portanto, o porquê de as codificações civis de muitos países da Europa e da América Latina não predeterminarem qualquer teto para as penas contratuais. Preferem conceder autonomia privada na criação da pena convencional, cujo valor sempre poderá ser revisto depois pelo Judiciário à vista de abusos.

Alex Vasconcellos Prisco é mestre em direito econômico e desenvolvimento pela Universidade Candido Mendes (UCAM), LL.M em direto empresarial pelo Ibmec e sócio do escritório Prisco, Ottoni e Del Barrio Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

 

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