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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Suprema Corte do Canadá muda entendimento sobre boa-fé (Parte 3)

14 de janeiro de 2015, 8h00
Por Otavio Luiz Rodrigues Junior
O caso Bhasin v. Hrynew [2014 SCC 71], de 13 de novembro de 2014, a despeito de sua contemporaneidade, já pode ser considerado um marco na jurisprudência canadense sobre a boa-fé objetiva, com reflexos para outros sistemas. Um dado comprova essa importância: em menos de dois meses, o precedente mereceu um verbete na Wikipedia, este último com referência a nossas colunas sobre o julgado, e notícias em jornais de circulação nacional no Canadá.
Nas colunas anteriores (Parte 1 e Parte 2), foram expostos os elementos descritivos e os fundamentos do acórdão da Suprema Corte do Canadá, que teve como relator o justice Cromwell. Agora, far-se-á a apresentação do dispositivo do acórdão e, em seguida, oferecer-se-ão alguns comentários de caráter comparatista.
Cromwell encerra seu voto com a resposta a alguns problemas que ele próprio formulou ao final de seu relatório.
A primeira conclusão (ou resposta) de Cromwell consiste em admitir a "entrada" para o Direito canadense (de common law, enfatize-se) da boa-fé objetiva como um princípio geral organizador, no entanto não a elevou ao status de um fundamento autônomo para a intervenção judicial nos contratos. Além disso, o acórdão não negou as demais formas de exteriorização da boa-fé no Direito anglo-canadense, ao estilo dos implied terms.
A segunda está na limitação da incidência da boa-fé à execução do contrato, não se aplicando à fase de negociações preliminares.
A terceira está em que se preserva o direito das partes de decidir sobre a continuidade dos vínculos contratuais. A exceção está, como afirmado reiteradamente no acórdão, especialmente nos parágrafos 86, 90-91 e 103, no reconhecimento da existência de práticas maliciosas voltadas a impedir a renovação do contrato.
A adoção da boa-fé como princípio geral organizador dependerá muito da experiência jurisprudencial e de modo como suas funções serão compreendidas pelos tribunais e pelas partes. O relator, a todo momento, ressalta que não é seu objetivo abrir as portas do Direito canadiano de língua inglesa para um novo instrumento de "moralismo judiciário".
Ao final do acórdão, o tribunal relembrou a tese do juízo de primeiro grau de que a empresa Can-Am[1] agiu desonestamente contra Bhasin ao exercer o direito postestativo assegurado pela cláusula de não renovação automática. O exame das conclusões da Alberta Court of Queen's Bench  pela Suprema Corte levou a este tribunal a acolher a tese do comportamento desonesto da Can-Am em face de seu representante Bhasin. Não se negou o direito a não renovar o contrato, mas se afirmou que os meios utilizados tornaram o exercício dessa prerrogativa uma conduta desonesta.
Outro ponto importante no julgamento foi definir se haveria um conluio entre a Can-Am e o Sr. Hrynew, que terminou por assumir a área de representação do Sr. Bhasin em Alberta. Diversos fatos comprovados na instrução processual apontaram a participação de Hrynew no processo de desestabilização dos  negócios de Bhasin, como relatado na primeira coluna da série.
A Suprema Corte do Canadá, nesse capítulo, acompanhou o resultado do Tribunal de Apelação e eximiu Hrynew  de qualquer participação nos atos que culminaram com a não renovação do contrato entre a Can-Am e Bhasin.  De modo explícito, no parágrafo 105 do acórdão, Cromwell declara que Hrynew não pode ser acusado de ter induzido a violação de um dever contratual de execução honesta por parte da Can-Am. Em linguagem mais próxima de nosso modelo, a Suprema Corte recusou a Hrynew o papel de "terceiro cúmplice na violação do contrato".
No parágrafo106, Cromwell foi mais explícito: "(...) à luz de minhas conclusões, a única violação do contrato neste caso é violação do dever de execução honesta e não houve indução à quebra do contrato".  Com isso, Hrynew foi considerado parte ilegítima do processo.
Definida a responsabilidade exclusiva da Can-Am e afastada a incidência da doutrina do terceiro cúmplice, a Suprema Corte passou à etapa de quantificação de danos. A condenação baseou-se no valor atribuído pelo juízo de primeiro grau ao negócio de Bhasin, o que atingiu o montante de 87 mil dólares canadenses.
Alguns leitores, em contato com o colunista, mostraram-se extremamente surpreendidos com o acórdão. Houve quem considerasse o julgado canadiano muito atrasado em relação às soluções a que o Brasil já chegou faz muito tempo. Outros manifestaram pesar pela entrada do Direito Canadense anglófono em um arriscado modelo de intervenção judicial nos contratos.
O exame crítico do acórdão deve ser, contudo, antecedido por duas advertências. A primeira está nos riscos da inadequada "importação" de conceitos, categorias e normas jurídicas estrangeiros,[2] tal como já salientado em outra coluna. O caso canadense é emblemático quanto a isso, pois no país coexistem a tradição de civil law, preponderante em Québec, com seu Código Civil, e a de common law, que é, em relação à inglesa, à australiana e a parte dos estados norte-americana, extremamente original.
A segunda advertência, mais específica em torno da expressão boa-fé, está em que este conceito não pode ser tratado de maneira uniforme pela simples tradução de bona fides, good faith, bonne foi ou Treu und Glauben, para se ficar apenas no latim, no inglês, no francês e no alemão. Entre cada um desses Direitos nacionais existe uma miríade de sutilezas e de diferenças conceptuais da "boa-fé" que se torna extremamente arriscado fazer aproximações e diferenciações puramente linguísticas.  O acórdão, neste aspecto, foi muito infeliz em diversos parágrafos. Veja-se, por exemplo, o parágrafo 83, quando se analisou o Código Civil de Québec e citaram-se os artigos 6o, 7o e 1.375 para se afirmar sobre o tratamento subjetivo e objetivo da boa-fé. Ora, para um leitor da tradição de civil law, essa diferenciação é mais do que óbvia e ela vem acompanhada do reconhecimento de 2 espécies de boa-fé, a objetiva e a subjetiva. Essa diferenciação é diferente de se afirmar que a boa-fé teria um aspecto objetivo e outro subjetivo. Desse equívoco original, o acórdão ora se refere a condutas violadoras da boa-fé objetiva, ora dá exemplos de condutas contaminadas pela má-fé como se fossem faces da mesma moeda.
Bem, a segunda advertência acabou por extrapolar os limites e "entrou" no exame do próprio acórdão. Siga-se, portanto, o caminho já aberto. Essa confusão terminológica é exasperadora para um leitor da tradição de civil law, especialmente se este for influenciado pelo Direito Civil alemão, como é o caso do brasileiro. O relator do caso Bhasin v. Hrynew chegou a resultados muito modestos e nada surpreendentes porque desconhece — ou não julgou relevante utilizá-los — os enormes avanços dogmáticos da literatura alemã do século XX sobre a boa-fé objetiva. Distinções sobre incidência da boa-fé na execução do contrato e em suas fases anteriores e posteriores é algo banal para o civilista brasileiro. O acórdão, como se observou, admitiu a incidência apenas na fase de execução e a rejeitou expressamente na fase de formação do negócio.
O caso Bhasin v. Hrynew, se tivesse sido apresentado a um tribunal brasileiro, teria provavelmente um resultado parcialmente similar. Faça-se um exercício quanto a esse julgamento "transplantado": uma empresa de planos de saúde (não há equivalente brasileiro de uma empresa que comercializa planos para custeio da educação, ao menos com importância macroeconômica) contrata um pequeno empresário para rever seus produtos. Com o tempo, para favorecer outro representante, amigo do gerente regional, a empresa faz todo tipo de expediente para reduzir-lhe a base de negócios, retirar-lhe os melhores vendedores e devassar suas contas, repassando os dados para o concorrente local. Passado um tempo razoável, a empresa tem fundamentos para não renovar o contrato e, com isso, a despeito de uma relação mutualística e colaborativa, praticamente destruir a atividade de seu parceiro comercial. O outro revendedor entra em conluio com a empresa e incentiva essas práticas, as quais resultarão em sua entrada na região do primitivo representante.
Antes da vigência do Código Civil de 2002, com base exclusivamente em princípios com ao boa-fé objetiva, seria possível defender a posição do pequeno revendedor e obter alternativamente tutela para se manter o contrato por um tempo razoável, até que se conseguisse um novo parceiro ou que se liquidassem os investimentos feitos, ou uma tutela ressarcitória, esta última a deferida pela Suprema Corte canadense.
O parágrafo único do artigo 473 do Código Civil de 2002 terminou por resolver essa questão de modo normativo — e não apenas principiológico — ao assegurar o direito a resilição unilateral dos contratos, por meio de simples denúncia notificada à outra parte. No entanto, se "dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos".  A respeito desse dispositivo, já escrevi que: "Doravante, além de casos especiais previstos em leis extravagantes, uma das partes não poderá simplesmente resilir o contrato sem considerar a eventualidade de que tal ato venha a comprometer a própria existência econômica da outra parte. A norma do parágrafo único do artigo 473 fazia-se há muito necessária. De fato, tornou-se assaz frequente no Brasil o aniquilamento repentino de empresas pelo mero exercício da faculdade resilitória, em especial nos contratos de colaboração (...) Ao viso deste estudo, o parágrafo único do artigo 473 não objetiva a perpetuação dos contratos. Trata-se de uma norma que concretiza a boa-fé objetiva, aplicando-a a uma pletora de negócios jurídicos amplamente massificados na realidade brasileira e que se marcam pelo extremo mutualismo entre as partes."[3]
Quanto ao problema da interferência de Hrynew, a leitura do acórdão dá a entender que este último realmente agiu como um terceiro cúmplice. Pode-se considerar que a Suprema Corte não deu suficiente peso às provas contidas na instrução. Nesse ponto, o tribunal canadiano, se reconhecesse a interferência ilícita em negócios alheios, simplesmente aplicaria um constructo teórico reconhecido em seu próprio país e em outros de tradição de common law. Refere-se à doutrina do terceiro cúmplice, que também se acha desenvolvida no Brasil, seja com estudos dogmáticos, ao exemplo de nosso artigo de 2004[4], seja no belíssimo acórdão do Superior Tribunal de Justiça, do ministro Humberto Martins, pioneiro em seu reconhecimento no STJ em uma matéria de Direito Público.[5]
As duas observações feitas pelos leitores sobre o acórdão canadense merecem ser revisitadas. Ambas são paradoxalmente válidas e inválidas.
De fato, se comparado com as soluções a que se chegou no Direito Contratual brasileiro, o acórdão canadiano pode ser qualificado como pouco inovador. A questão pode ser vista, porém, sob outro ângulo: o Direito brasileiro é bem mais avançado nesse ponto dada a longa e triste história de quebras contratuais, crises econômicas e abuso de posições no mercado. Em nosso caso, pode-se dizer que existe "tecnologia de ponta" nesse tema, o que é motivo de orgulho e de lástima, por razões evidentemente diversas. No Brasil, deve-se hoje buscar meios de se controlar os excessos de voluntarismo (na concepção teórica) e de subjetivismo (na aplicação prática) de instrumentos como a boa-fé. Se isso não ocorrer, os frutos saborosos do salgado plantio dessa árvore poderão amargar.
Quanto ao outro comentário, a respeito da concessão dos canadenses ao modelo da boa-fé como "princípio geral organizador", valem as mesmas ponderações quanto ao prisma pelo qual se enxerga o acórdão canadiano. Sim, o abandono de 100 anos de tradição jurisprudencial pode ser lamentado pela quebra da solidez do modelo anglo-canadense. O argumento de Bhasin de que o Canadá deveria seguir o exemplo de "outras jurisdições", sob pena de seu isolamento, é bem conhecido dos brasileiros, quando se pretende mudar nossas normas para ajustá-las a um suposto viés do mercado internacional (parágrafo 29 do acórdão). As críticas de Cromwell, reiteradas aliás (parágrafos 33, 34, 62 e 70), ao modo incoerente com que a boa-fé é utilizada no Canadá bem poderiam ser formuladas em relação a outros institutos de common law. Seria essa uma real incoerência ou uma característica de um modelo que tem pouca devoção pelo caminho continental de um Juristenrecht, um "Direito dos professores", sistematizador e dedutivo?
A justiça da tese de Bhasin é inegável. O tribunal canadense não lhe poderia ter negado o direito. A argumentação, porém, esconde problemas sérios para o futuro do Direito Contratual canadiano. O relator, em diversas passagens, pretende se imunizar contra o uso "moralista" da boa-fé (vide parágrafos 70 e 79). Ao dizer que não o deseja, termina por exalçar um certo sentimento de culpa. Afinal, excusatio non petita accusatio manifesta.  Em bom português, quem se escusa, se acusa. Espera-se que isso não ocorra. E é provável que não se verifique, dadas as condições históricas do Canadá. Ao estilo do que já escreveu aqui, não se pode orgulhar de um sistema contratual rico de precedentes e de constructos, como é o nosso, se a causa disso está em uma profunda disfunção social e econômica. De qualquer sorte, a coerência técnica e o rigor dos conceitos, nos dias de hoje, não podem mais ser acusados de instrumentos de um formalismo estéril. São, em verdade, uma das poucas proteções que restaram aos que desejam conhecer as razões pelas quais seus direitos são tolhidos.
[1] A empresa Can-Am, ou seja, Canadian American Financial Corp. (Canada) Limited), mudou se razão social ao longo do julgamento. Ela se tornou posteriormente Allianz Education Funds e, quando da prolação do acórdão, seu nome era Heritage Education Funds Inc. Em seu voto, Cromwell optou por denominá-la simplesmente de Can-Am.
[2] Utilizou-se a expressão "importação", com aspas, para destacar seu caráter genérico e pouco rigoroso tecnicamente. Há diversos fenômenos como a recepção, o legal transplant ou a internação, cujo sentido é bastante específico e deve ser respeitado.  Para uma leitura mais cuidadosa sobre esses termos, sugere-se a leitura da seção 4.1. do artigo  A influência do BGB e da doutrina alemã no direito civil brasileiro do século XX, disponível aqui: http://www.direitocontemporaneo.com/wp-content/uploads/2014/01/A-Influ%C3%AAncia-do-BGB-e-da-Doutrina-Alem%C3%A3-no-Direito-Civil-Brasileiro-do-S%C3%A9culo-XX.pdf  e aqui https://www.academia.edu/8066581/A_INFLU%C3%8ANCIA_DO_BGB_E_DA_DOUTRINA_ALEM%C3%83_NO_DIREITO_CIVIL_BRASILEIRO_DO_S%C3%89CULO_XX
[3] RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Revisão judicial dos contratos: Autonomia da vontade e teoria da imprevisão. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2006.  p. 76 e 78.
[4] RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. A doutrina do terceiro cúmplice: Autonomia da vontade, o princípio res inter alios acta, função social do contrato e a interferência alheia na execução dos negócios jurídicos. Revista dos Tribunais, v. 821, p.80, mar. 2004. Disponível aqui: https://www.academia.edu/7188746/A_DOUTRINA_DO_TERCEIRO_C%C3%9AMPLICE.
[5] REsp 468.062/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 11/11/2008, DJe 01/12/2008.
Otavio Luiz Rodrigues Junior é professor doutor de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e doutor em Direito Civil (USP), com estágios pós-doutorais na Universidade de Lisboa e no Max-Planck-Institut für ausländisches und internationales Privatrecht (Hamburgo). Acompanhe-o em sua página.
Revista Consultor Jurídico, 14 de janeiro de 2015, 8h00

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

How to Grow a Law Professor

Michael Blanding

A fellowship for lawyers who want to teach and study law

For many years it was possible to get a job as a law professor mainly by performing brilliantly as a law student and then clerking for a prestigious appellate court. Over time, there’s been an increased focus on candidates’ publication records, and as a result: “Promising entry-level candidates need to show a track record of writing and publishing scholarship,” says Susannah Barton Tobin ’04, managing director of the Climenko Fellowship Program and assistant dean for academic career advising at Harvard Law School.

In the 1990s, law schools began hiring in greater numbers those who had proved their methodological chops by earning a Ph.D. in another field. But that approach disadvantaged smart lawyers who were working at private firms, nonprofits, or the government and had not had time to write. A decade ago, then HLS Dean (and now Supreme Court Justice) Elena Kagan ’86 proposed a middle path, one on which practicing lawyers could return to the academy for two years and begin creating their own body of scholarship. In 2004, she established the Climenko Fellowship Program with funding from a bequest from attorney Jesse Climenko ’27.

Credit: Kathleen Dooher This year’s Climenko Fellows include Daniel Farbman ’07, Erica Goldberg, Monica Bell, Brian Richardson and Maggie McKinley. On the wall are caricatures of past fellows.

“The purpose is to provide people who are super talented and smart and creative and working hard with a chance to reflect and do their own work before going on the job market,” says Tobin. And at the same time (in keeping with the intent of the Climenko bequest to support instruction in the practical aspects of lawyering), fellows teach legal research and writing to first-year law students, drawing on their own experiences from practice, in order to train the next generation of lawyers.

The program has trained more than 50 aspiring law professors.

In its first 10 years, the program has trained more than 50 aspiring law professors (about half of whom are HLS alums), who—in an increasingly competitive job market—have gone on to academic careers at law schools such as Berkeley, Duke, Georgetown, Michigan and Texas. Each year, six or seven new fellows are chosen from a pool of over 120 applicants.

Credit: Kathleen Dooher Dan Epps ’08 came to the Climenko Fellowship Program after three years in law firm practice. All along, he had planned that someday, he’d return to law school to teach.

For Dan Epps ’08, currently in the second year of the two-year fellowship, the opportunity has been invaluable. Not that Epps didn’t already have an impressive resume, including clerking for Supreme Court Justice Anthony Kennedy ’61 before serving three years at D.C. law firm King & Spalding. But all along he intended to return to law school to teach, following in the footsteps of mentors such as the late HLS Professor Bill Stuntz, who had instilled in him a passion for criminal procedure.

Going into the fellowship, Epps was focused on a particular idea: “In criminal law, people say it’s better for 10 guilty people to go free, so one innocent person can escape,” he says. “It’s an axiom we use to justify a lot of rules.” As he began to look into the concept, however, he found that surprisingly little research had actually been done to justify it. And in fact, the opposite might be true: The legal system might be perversely harming innocent defendants by creating the impression in the public mind that, indeed, it routinely lets guilty people go free.

Credit: Joshi Radin HLS Professor Jacob Gersen, faculty adviser to the Climenko Program

When he began presenting the idea, however, he found it a tough sell. In conversations with other fellows, he began to crystallize the idea and respond to objections—a process that is part of the fellowship, says HLS Professor Jacob Gersen, faculty adviser to the program. “We have an internal workshop we call the ‘half-baked ideas workshop,’” Gersen says. “If an idea is going to work, you need a venue to talk about it and find out if it’s good, bad, silly, or already been done. If you can filter out bad ideas quickly, then you can get on to the good ideas more efficiently.” Through workshops with fellows and consultations with faculty, says Epps, he was able to refine his argument, which he developed as a paper that will be published in the Harvard Law Review early in 2015 and that he will use to present in interviews. “I’ll be using that paper as my job talk, knowing I’ve already been put through the paces,” he says.

The all-important “job talk”—the paper candidates present when they apply to schools—is an essential part of interviews, says Gersen, and the right paper can make or break an application. In addition to helping fellows refine their ideas, the fellowship helps them decide on the best topic to write about in the first place.

That was the challenge facing Seth Davis, who entered the program in 2012, focused on administrative law, property, federal Indian law, federal courts and torts. “I came into the program with big ideas about pluralism and the relationships among the federal government, the states, and Indian tribes,” Davis says, “but I needed to learn how to sequence the writing of three planned articles so as to have a successful job talk ready for the market.” Eventually, his work on presidential power and property law grew into the paper he used to secure a position last year at University of California, Irvine School of Law. Davis worked with HLS Professors Joseph Singer ’81, David Barron ’94 (now a federal judge), and Gersen in developing his job talk paper. Based on his work, Davis was recently invited by Singer and his fellow co-editors to join the editorial board of “Cohen’s Handbook of Federal Indian Law.”

“Our job is to try to teach the craft of research and to allow the fellows’ intellectual identities to emerge.”

—Jacob Gersen

While the fellowship can be a path to law teaching directly from practice, some candidates also come from graduate study. Anne Fleming ’05 clerked for two years and then practiced law at South Brooklyn Legal Services before pursuing a Ph.D. in history at the University of Pennsylvania. The Climenko Fellowship offered a perfect opportunity for her to discuss her ideas with scholars who had been trained in other disciplines and who had worked in different fields of law. “After spending three years in a history department, I benefited immensely from talking about my scholarship with the methodologically diverse group of fellows and faculty at Harvard, including those who are not legal historians,” she says. At the time, she was working on an article describing the history of the “unconscionability doctrine,” under which a court can refuse to enforce contract terms as written if they are deemed unjust by the court.

Fleming says discussion with her peers helped her balance the historian’s desire to remain faithful to the perspective of the time she was writing about with the law professor’s need to explain the implications of her work for present-day policy design. “One question that helped refine my thinking about the policy ‘payoff’ of the paper was about how much the court’s reasoning mattered versus the flood of publicity that came after [a] decision. It really shaped not just the way I answered present-oriented questions about policy design but also made me think more deeply about how litigation fit into my historical narrative,” says Fleming, who published her paper in The Georgetown Law Journal and joined the faculty of Georgetown University Law Center this fall.

In addition to the writing and research it enabled her to do, Fleming credits the fellowship with preparing her to teach first-year law students. Each fellow is responsible for a 40-person section of an introductory legal writing course, where they are able to apply their on-the-job experience to help students learn to write legal briefs. “There is a misplaced assumption that people who want to become law professors do it only to follow their own research,” says Tobin. On the contrary, she says, fellows are usually themselves inspired by law professors “and want to give back to that legacy through their teaching.”

Credit: Kathleen Dooher For Ben Levin ’11, it was his exposure to Climenko Fellows as a student that inspired him to explore a career in law teaching.

For Ben Levin ’11, it was exposure to Climenko Fellows when he was a student that inspired him to seriously explore a career in law teaching. Now a Climenko Fellow himself, he says having the opportunity to take a course with someone actively in pursuit of legal academe enabled him to imagine more clearly what it would be like, and decide he would likely find it fulfilling.

Beyond teaching the legal writing course, fellows often develop seminars for students based on their own expertise and participate in student life in other ways. Based on her interest in consumer debt and bankruptcy, Fleming created a seminar for upper-level law students that she taught in the second year of the fellowship and now is teaching at Georgetown. While at Harvard, Davis mentored students in the Native American Law Students Association and got them involved in tracking cases of interest to Indian tribes. “For as long as I was there, I wanted to become part of a community,” says Davis.

Credit: Kathleen Dooher Susannah Barton Tobin ’04, managing director of the program, with the Board of Student Advisers members Claire Johnson ’15, David Curtis ’15 and Emily Nash ’16, who are assisting Tobin in teaching one of the sections of the first-year writing course. Each Climenko Fellow teaches a section of course, supported by three members of the BSA.

As much as anything, according to Tobin and Gersen, the program offers its participants an opportunity to steep themselves in a legal academic environment, giving them the confidence and instincts that can come only from participating in a scholarly community and developing their own work in conversation with colleagues and mentors. “When you hit on a thesis that illuminates the connections among seemingly unrelated questions, you begin to understand who you are as a scholar,” says Gersen. “Our job is to try to teach the craft of research and to allow the fellows’ intellectual identities to emerge. Then when it is time for them to go on the job market, hiring committees know who they are and why they do what they do—and more importantly, the fellows know it themselves.”

 

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Good Faith: The European View

, Commercial Leasing Law & Strategy

December 29, 2014

The concept of good faith is firmly established in the civil law jurisdiction of the European Union (EU), although it manifests itself in different forms in each of them, despite the influence of both the German and French law.

Although common law lawyers may not like it, the traditional idea that good faith is not part of common law business-to-business contracting is now outdated, whether in England, Ireland or the United States. An implied concept of good faith is steadily gaining recognition as a legally binding concept and independent cause of action in common law systems during the performance phase of contracts, particularly in long-term relational agreements such as franchise agreements.

Where good faith is treated as a legally binding, independent cause of action, it may involve different behaviors in different contexts, such as fair dealing, transparency and honesty. The Yam Seng Limited v. International Trade Corporation Limited, [2013] EWHC 111 (QB), case in England draws together the different strings making the law on good faith more coherent, and perhaps offering some lessons for U.S. legislators. In Yam Seng, the Singapore-based company Yam Seng entered into an exclusive distribution agreement with International Trade Corporation (ITC), an English company, to market soccer club Manchester United-branded toiletries to duty-free outlets in Asia and the Middle East. Unfortunately, the relationship was far from successful and the judge held that ITC's CEO misled Yam Seng about legal, commercial and logistical issues, and repeatedly missed deadlines for supplying products to the company. He made promises he knew he could not keep, undercut prices agreed with Yam Seng, and provided information that the judge held to be false. Yam Seng terminated the agreement and sued ITC for damages for breach of contract and misrepresentation.

The judge found in favor of Yam Seng and awarded it damages for breach of contract and misrepresentation (which equaled the same amount). An important issue that the court was asked to consider — in the context of whether ITC's conduct involved sufficiently serious breaches of contract to justify Yam Seng's termination of the agreement — was whether a duty of "good faith" should be implied into the contract. Justice George Leggatt held that the agreement contained an enforceable implied obligation on the parties to act in good faith and concluded that ITC had breached that obligation by knowingly concealing from Yam Seng the true situation concerning ITC's pricing arrangements with a crucial distribution channel in Singapore. The breach of that implied obligation was held to be repudiatory, thus justifying Yam Seng's termination of the agreement and entitling Yam Seng to the damages that it sought.

U.S. Approach

Had the matter been litigated in the United States, what conclusions would a U.S. court have reached? While U.S. courts would likely come to a similar conclusion with respect to the misrepresentation claim, it is unclear if they would go as far as Justice Leggatt did with respect to the breach of contracts claim. The implied covenant of good faith and fair dealing is intended as a contract-interpretation tool, but in cases with bad facts, some courts are willing to stretch the doctrine much further. Such was the case in Scheck v. Burger King, 756 F.Supp. 543 (S.D. Fl. 1991), in which the court held that even though the franchisee had no exclusive territory, this did not mean that Burger King had the right to open new restaurants in close proximity to the franchisee's restaurant.

It is not exactly the same as in Yam Seng, as the court did not grant the franchisee a right that was not expressly written into the contract; however, by denying Burger King the exercise of a right that was not regulated by the contract, it achieved the same results. The facts of Yam Seng being rather extreme, it is possible that a U.S. court would have taken a similar approach had it been asked to decide that case, and would have stretched the implied covenant of good faith and fair dealing, as happened in Scheck.

English Law

Justice Leggatt went on to analyze in great detail and clarity why English law should impose an obligation of good faith in a situation like that presented in Yam Seng . His judgment draws together the pre-existing, disparate strands of English case law on the issue of good faith in commercial contracts and explains the importance of implied good faith in what he called "relational" agreements — which are long-term agreements requiring extensive cooperation, a high degree of communication, mutual trust and confidence, and expectations of loyalty. In his opinion, he referred expressly to joint venture agreements, franchise agreements and long-term distribution agreements.

Justice Leggatt relied on the evolving attitude toward good faith in other common law countries, such as Australia, and sought to dispel the traditional English hostility to a binding good faith principle. Justice Leggatt doubted that English courts would recognize a requirement of good faith as a duty implied by law into all commercial contracts. He justified its implication into the distribution agreement between ITC and Yam Seng based on the presumed intention of the parties and the relevant background against which the contract was made. Justice Leggatt concluded that the relevant background could include shared values and behavioral norms (both general and specific to a particular trade or industry), as well as the specific facts known to the parties.

Justice Leggatt held that the test of good faith is an objective, not a subjective, one. The test is whether the conduct in question would be regarded as commercially unacceptable by a reasonable and honest person; it is not based on either party's perception of what is improper conduct. Justice Leggatt argued that the recognition of a duty of good faith is consistent with the case-by-case approach employed by common law systems, and it is not an illegitimate restriction of the parties' freedom of contract as it is open to them to restrict the duty by way of the express terms of the contract.

The Yam Seng case is the high water mark in the current series of good faith cases. Arguably, the concept was used to give legal credence to the judge's view that a wrong had been committed by ITC to which Yam Seng should, as a matter of equity, have some redress. The facts of the case are fairly specific, and there was clear evidence of bad faith and dishonesty by ITC. It would have been interesting to see whether the High Court decision would have been upheld under scrutiny from the Court of Appeal if ITC had chosen to appeal.

Conclusion

If Justice Leggatt's analysis of the common law approach to good faith is valid, it suggests that U.S. legislators may wish to consider adopting an independent cause of action for violations of a covenant of good faith and fair dealing based on an objective test as regards commercial acceptability from the view of a reasonable and honest person, rather than the more technical and interventionist approach taken by the German and French courts.

Currently, there is some movement in this direction by several states, at least with respect to franchising. For several reasons, there is much opposition to these bills, and it is unlikely that most of them will be adopted into law, at least in their current form. Were they to pass, it is likely that we would not have to wait long before there would be significant amounts of case law available to analyze how the covenant works in a common law framework.

Dr. Mark Abell is a partner at Bird & Bird, London. Beata Krakus is an officer in the Chicago office of Greensfelder, Hemker & Gale.


terça-feira, 16 de dezembro de 2014

How IBM shrunk a complex contract down to 2 pages

To Neil Abrams, assistant general counsel at IBM, better service to his clients and the customers means keeping it simple. That's why a team spearheaded by Abrams earned international recognition for taking dozens of pages of complex contracts for cloud services and reducing them to a simple, two-page document.

Abrams told CorpCounsel.com that the complex contracts for some 150 cloud services were creating a frustrating roadblock for customers last year. The contracts would end up in the hands of their lawyers, who would want to negotiate the wording, tying up lawyers on both sides.

"We developed a plan to cover only those things we considered essential," Abrams said, "and we used concise, plain language." It took his team about two months to boil down all the key points into the two-page document, to work it through the business side and translate it into more than 20 languages.

How did they do it? "That was challenging," he concedes. "We wouldn't reuse any preexisting contract clauses. And we had to avoid the common technique in contract drafting of cross-referencing or hyperlinking and incorporating other documents by reference."

Most companies also require a separate "professional services" contract that gives a detailed description of what the company is going to do. But the simplified IBM contract also covers services. And Abrams' team included intellectual property indemnification in the contract—"though most cloud providers do not provide that," he said.

"We learned that using a shorter contract takes a lot less time for the customers—and their lawyers," he explained. "And where there needs to be some negotiation, they can do that faster too."

He said the response has been positive from customers and internal clients, including the IBM sales team. And the International Association for Contract and Commercial Management named the company a finalist for its 2014 Innovation Award for Operational Improvement for "boldly and rapidly transforming its cloud computing contract process."

The success of this novel bit of contract work also earned Abrams something else. When he began the task, he was the head lawyer for software. Now he is an assistant GC assigned to look for ways to transform the client experience, including simplifying more contracts.

His latest project: A four-page contract released a few months ago that covers IBM's entire product line. Such contracts once averaged about 30 pages. This one allows a customer to choose the parts that apply to the product he wants.

The simplified contract was mentioned in the September issue of Fortune magazine during an in-depth profile of CEO Ginni Rometty about significant changes she is making at IBM.

Abrams said his new role is part of a drive for innovation across not only the legal department but all IBM departments. "We [IBM lawyers] are very focused on helping our business satisfy clients and innovate," he said.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Ensaio sobre Decadência, Prazo, Termo Final e Extinção de Eficácia do Negócio Jurídico

Humberto Theodoro Júnior

(*) Estudo em homenagem ao Professor João Baptista Villela


SUMÁRIO: 1 – Introdução 2 – O tempo e o direito 3 – Extinção dos direitos 4 – Termo de eficácia e termo de adimplemento  5 – Negócios jurídicos sujeitos a termo de eficácia e termo de   adimplemento 6 – Prazos extintivos 6.1 – Similitude entre termo final e decadência, no plano dos negócios jurídicos 7Contagem dos prazos nos negócios sujeitos a termo final  8 – A decadência e o termo final de seu prazo, segundo a jurisprudência 8.1 – Força do termo final 9 – Conclusões


1 – Introdução

O estudo do fenômeno da decadência exige a compreensão dos fatos envolvidos na extinção dos direitos e das situações jurídicas, por influência do decurso do tempo.

Semelhante análise reclama preocupação com noções básicas como as pertinentes não só ao conceito de extinção de direito, como ao de termo e prazo, e suas classificações.

É nesse terreno que pretendemos desenvolver o presente ensaio, tendo em conta que as noções apontadas nem sempre têm merecido a compreensão adequada e satisfatória, seja na doutrina ou na jurisprudência.

2 – O tempo e o direito

O tempo, como evento natural, pode, por si só, apresentar-se como fato jurídico “lato sensu”, com aptidão para produzir efeitos no plano dos direitos subjetivos, seja em razão da lei ou em função da declaração de vontade. Em outras palavras: o tempo, fenômeno da natureza alheio a qualquer comportamento humano, pode ser pressuposto de fato capaz de determinar consequências jurídicas relevantes, como o nascimento, a modificação e a extinção de direitos e relações jurídicas[1].

Muitos são os fatos jurídicos de eficácia instantânea, sobre os quais o decurso do tempo não exerce papel algum[2]. Outros há, porém, cujos efeitos se distanciam no tempo, dando origem aos direitos e obrigações a termo, sobre os quais incide um prazo que pode ser de nascimento, modificabilidade ou extinção.

Costuma-se confundir prazo com termo, classificando-se o prazo em inicial ou final, quando, na verdade, o que pode ser inicial ou final é o termo, isto é, o momento em que o fato jurídico ou o negócio jurídico começam a produzir efeito ou cessam de produzi-lo[3]. Decorre ele – segundo Pontes de Miranda – de determinação da vontade ou da lei que define o tempo certo em que “há de começar certa eficácia ou que há de terminar toda a eficácia… ou algum ou alguns efeitos do ato jurídico hão de terminar”. A manifestação de vontade, in casu – ainda conforme o tratadista –, “só opera no plano da eficácia; noutras palavras:  somente concerne ao nascimento, modificação ou extinção de direitos, deveres, pretensões, obrigações, ações e exceções”.[4]

Prazo, por sua vez, não é momento, mas espaço temporal entre dois termos ou dois momentos eficaciais[5]. Falar-se, então, em prazo inicial e prazo final, só tem sentido, se, por metonímia, se considerar que, pelo primeiro se alcança um termo inicial, e pelo segundo, um termo final.[6]

Estabelecido um momento posterior ao fato jurídico para que seus efeitos comecem a ocorrer, ter-se-á um prazo cuja implementação provocará o termo inicial. O estabelecimento, portanto, de termo inicial “suspende o exercício do direito”, embora este já tenha sido adquirido, desde o fato que lhe deu origem (Cód. Civil, art. 131). Pelo termo inicial há apenas uma prorrogação do momento de eficácia do negócio jurídico já aperfeiçoado ou um fato jurídico já consumado.

O termo final opera em sentido contrário, já que sua função é determinar a extinção de um direito, de uma situação jurídica ou da faculdade de exercer um direito ou uma pretensão.[7] Tal termo, é figurável não apenas nos negócios jurídicos, mas também em faculdades, deveres e obrigações que emergem da lei. “O termo final – lembra Pontes de Miranda – pode ser concernente a direito, ou a pretensão, ou a ação e, até, a exceção. O que se subordina ao termo pode ser qualquer efeito”[8]

É, por exemplo, o referir-se o termo à eficácia do direito ou da pretensão que permite distinguir entre decadência e prescrição. A decadência acarreta a extinção do próprio direito não exercido durante o tempo de duração da respectiva eficácia, enquanto a prescrição põe fim à pretensão nascida da violação de um direito, cuja reparação não foi reclamada pelo titular no tempo de lei. Há, nos dois casos, termo final de eficácia, mas de objetos distintos. Na decadência, extinguem-se o direito e a ação que o tutelava. Na prescrição, extinguem-se a pretensão e a ação que viabilizava seu exercício, mas subsiste o direito, embora enfraquecido por falta da ação.

3 – Extinção dos direitos

A exemplo dos seres da natureza, os direitos comportam-se como seres vivos, isto é, “nascem de diferentes causas, se modificam por diferentes causas e por diferentes causas se extinguem”[9].

“Por extinção de um direito – ensina Caio Mário da Silva Pereira – deve-se entender o seu fim, a sua morte, o seu desaparecimento”[10]. Há direitos que só se extinguem com o seu titular; outros há cuja extinção ocorre em virtude da vontade de outrem exercida com base nos chamados direitos formativos ou potestativos; sempre, outrossim, que a regra jurídica exige como suporte fático um ato ou omissão do próprio titular do direito, diz-se que, à falta de tal suporte, “o direito caiu, caducou.” Nesse sentido, a caducidade “supõe conduta do titular que a lei repute assaz para que o direito deixe de ser”. Dá-se a preclusão, em sentido estrito, se a extinção ocorre em razão do decurso do tempo, apenas.[11]

Não se devem confundir, frente às faculdades jurídicas, a perda e a extinção. Substancialmente são fenômenos diversos e de diferentes efeitos. “Dá-se a perda do direito – na lição de Caio Mário –, quando ele se separa do titular atual, e passa a subsistir com outro sujeito”. Pense-se nas alienações do domínio e nas cessões de crédito. “Na perda há – para o mesmo civilista – uma ideia de relatividade, de vez que o sujeito não pode mais exercer as faculdades jurídicas”[12], embora outrem o possa.

A extinção, por sua vez, é um conceito absoluto, que importa a completa destruição do vínculo jurídico. “As faculdades jurídicas não podem ser exercidas pelo sujeito atual, nem por outro qualquer”[13].

Explica Caio Mário que a extinção completa do direito pode ocorrer em razão do sujeito, do objeto ou do vínculo:

(i) Extinção subjetiva ocorre em relação aos direitos personalíssimos e, por isso, insuscetíveis de transmissão, de modo que, se o titular morre ou perde a faculdade de exercê-los, os direitos da espécie desaparecem ou se destroem.

(ii) Extinção objetiva é a que se origina do perecimento do objeto sobre que versa o direito, como na morte do animal vendido, antes da tradição, ou a ruína do prédio arrendado, quando, em qualquer caso, não ocorra a sub-rogação da obrigação no equivalente econômico; os direitos reais, por exemplo, não têm como subsistir após o perecimento do respectivo objeto.

(iii) Extinção em razão do vínculo ocorre nos casos em que sobrevive o sujeito e subsiste o objeto, “mas falta ao titular o poder de ação para exercer as faculdades jurídicas”, como se passa com a decadência (perda do direito) e a prescrição (perda da pretensão)[14].

Nessa mesma perspectiva, Pontes de Miranda registra que a morte do titular do direito, seja ativo, ou seja passivo, põe fim à relação jurídica a que se achava vinculado. Mas, se se trata de direito transmissível causa mortis, “não se extingue o direito, ou o dever, a pretensão, ou a exceção, ou a obrigação, a ação ou a legitimação passiva na ação ou na exceção”[15]. Emigra, o direito, de um sujeito para outro.

Vários são, enfim, os direitos que, por sua próprio estrutura, “trazem ínsita a causa de sua própria extinção”, de sorte a merecer a qualificação de direitos transitórios”. Nessa categoria incluem-se, por exemplo, (i) os direitos constituídos a termo (Código Civil, art. 131), os quais “desaparecem com o escoamento do prazo”; e (ii) os direitos subordinados à condição resolutiva (Código Civil, arts. 127 e 128), cujo implemento importa no seu perecimento.[16]

A extinção dos direitos – vista de outro ângulo – opera bilateralmente, de sorte que eliminadas as faculdades que tocavam ao sujeito ativo da relação jurídica, extintos também estarão os deveres correlatos do sujeito passivo. “A dívida desaparece”. No caso dos direitos reais sobre coisas alheias, desaparecem o usufruto, o uso, ou a habitação, “de maneira que os elementos, que se afastaram, para lhes fazer o suporte fático, volvem à propriedade”. Prossegue Pontes de Miranda:

“Extinção em direito, como em física, em matemáticas, em lógica e em todas as ciências, é deixar de ser, ser ‘nada’. O devedor, que alega ter-se extinto o direito do credor, alega ter-se extinto a sua dívida. O proprietário, que objeta ter-se extinto o usufruto de outrem em sua propriedade, objeta que não há mais aquele direito e ele, dono da propriedade nesse momento, não tem o dever de proceder, que teria, se o usufruto existisse”[17].

Em síntese, os termos desempenham papel decisivo na vida dos direitos, faculdades e pretensões, já que predeterminam, ou podem predeterminar, tanto o início da eficácia, como o seu fim. Com efeito, é por seu intermédio, na maioria dos atos e negócios jurídicos, que se define o momento do nascimento dos direitos, bem assim o seu perecimento, morte ou extinção.

4 – Termo de eficácia e termo de adimplemento

A clássica divisão dos prazos e termos em iniciais e finais, todavia, não esgota as espécies e funções que tais categorias jurídicas exercem no plano dos fenômenos negociais. Com efeito, além dos prazos para iniciar ou findar a eficácia de negócio jurídico, há na ordem jurídica os prazos estabelecidos para o adimplemento das obrigações e para o exercício dos direitos potestativos.

Na categoria dos prazos e termos finais, a perda do direito não decorre da inércia do titular, mas apenas do fim preordenado do vínculo jurídico. Os direitos sujeitos a essas modalidades – como bem explica Caio Mario da Silva Pereira[18] – são direitos transitórios, que já nascem com prazo de eficácia prefixado. Podem ser exemplificados por meio do fornecimento de alimentos, assinaturas de jornais ou periódicos, locação por temporada, comodato etc. Durante todo o período de vigência, há o desfrute (ou a possibilidade de desfrute) dos direitos decorrentes do negócio ou da situação jurídica, e sua extinção advém do puro e simples termo final, sendo de nenhuma relevância o adimplemento (ou não) de qualquer prestação ou a prática (ou não) de qualquer ato por parte do respectivo titular. A hipótese é de prazo extintivo simples[19].

Outros prazos são concebidos para que o titular de um direito exerça-o dentro de um termo fatal. Sua inércia acarretará a extinção ou caducidade do direito. Configurar-se-á o denominado prazo de decadência, cuja incidência independe de violação cometida pelo sujeito passivo e se baseia unicamente no não exercício do direito pelo titular em tempo útil. Há, também, prazos estabelecidos para o exercício de pretensões (derivadas de violação de direitos) e, que, igualmente, se encerram pela inércia do titular em reagir contra o ofensor. Aqui o prazo, que não é fatal, pois admite impedimento, suspensão e interrupção, configura o denominado prazo prescricional.

Há, enfim, prazos estipulados para cumprimento de prestações, cuja transgressão submete o obrigado faltoso às sanções da mora ou do inadimplemento, sem que, necessariamente, ocorra o rompimento do vinculo jurídico entre as partes. A essa modalidade de prazo atribui-se a denominação de prazo de adimplemento, em contraposição ao prazo de eficácia, que deriva, pura e simplesmente, do termo final a que o destino do vínculo jurídico se achava atrelado, desde a origem.

Diante dessa distinção, a doutrina lembra a necessidade de considerar o que seja, em outra nomenclatura, o “termo essencial” e o “termo não essencial”. Tal classificação aplica-se, particularmente, aos termos de cumprimento ou adimplemento. Segundo esclarece José de Oliveira Ascensão, tem-se como “termo essencial” aquele, a partir do qual, o obrigado “cai no incumprimento definitivo”[20]; e como “termo não essencial” aquele cuja ultrapassagem apenas “conduz à mora do devedor”[21]. No primeiro caso, a obrigação resolve-se em perdas e danos, e, no segundo, surge, para a parte prejudicada, a opção de executar judicialmente a prestação inadimplida acrescida dos consectários da mora, ou de rescindir o contrato.

5 – Negócios jurídicos sujeitos a termo de eficácia e termo de adimplemento

As obrigações criam poderes e deveres entre as partes, necessariamente temporários. Nascem fadados a extinguirem-se quando atingido o escopo (o fim) para o qual a vontade negocial foi endereçada. Com o cumprimento deste objetivo (meta optata), exaure-se o vínculo jurídico, ficando o credor satisfeito e o devedor liberado.

As estruturas do negócio pactuado, porém, não são sempre iguais: há, por exemplo, contratos unilaterais e contratos bilaterais, assim como existem contratos consensuais e contratos de eficácia real. Essa diversidade estrutural permite a constatação de que há (i) negócios jurídicos cuja extinção se submete apenas a termo de eficácia, (ii) ou tão somente a termo de adimplemento, ou, ainda, de que há (iii) aqueles que provocam a coexistência de ambas as modalidades de termo.

Num contrato unilateral como o empréstimo, por exemplo, o vínculo se estabelece todo em função da obrigação de repor a quantia mutuada. A relação contratual subsiste à espera do pagamento, pelo mutuário, da quantia que o mutuante lhe repassou. É claro que as partes estipularam um termo para a duração do vínculo obrigacional (vencimento do empréstimo). O mais importante, contudo, para exaurir a relação jurídica, não é o vencimento, é o pagamento da dívida contraída pelo devedor. O contrato de empréstimo, portanto, é um daqueles cujo destino se sujeita, predominantemente, a um termo final de adimplemento.

Quer isto dizer: o vencimento da obrigação, por si só, não a extingue; de maneira que o seu desrespeito por parte do devedor não é suficiente para acarretar a morte do vínculo jurídico que o une ao credor. A violação do prazo negocial, por isso, é causa apenas da mora debitoris.[22]

Outra é a situação dos contratos de eficácia real (aqueles em que uma parte cede, temporariamente, a posse ou o desfrute de um bem). Em relação a esses contrato, o regime é o do termo final de eficácia. Atingido este, extingue-se ipso iure o vínculo obrigacional, pouco importando tenha o vencimento do prazo recaído, ou não, em dia útil. O uso da coisa não pode ultrapassar o termo de eficácia do negócio jurídico.

Igual regime prevalece também para os contratos de duração, como os de prestação de serviços ou de fornecimento. Quem se obriga, por exemplo, a fornecer transporte durante dez dias, ficará liberado no termo final previsto, ou seja, quando completado o décimo dia da prestação a que se obrigou. O mesmo acontecerá com a empresa que contraiu a obrigação de fornecer energia ou outros insumos, durante prazo certo. Em casos como estes, o termo é fatal, e não sofre prorrogação pela eventualidade de recair em feriado.

Há, ainda, contratos bilaterais em que se estipulam prazos de diferentes naturezas para obrigações impostas a ambas as partes. Na locação ou na concessão de uso, ou na constituição de direito real de superfície, v.g., o dono do bem cedido sujeita-se a assegurar a posse e desfrute ao destinatário do respectivo uso, enquanto este se obriga a pagar periodicamente (ou de uma só vez) o preço convencionado para remunerar a cessão. Em relação ao vínculo a que se acha jungido o dono do bem, o termo final é um termo de eficácia, cujo atingimento acarretará sua imediata liberação, não sendo relevante a circunstância de o vencimento recair em feriado ou em dia útil.

Em relação, porém, aos prazos de pagamento dos encargos periódicos do usufruidor do bem cedido, a natureza dos respectivos vencimentos é a de termo de adimplemento[23].

Deve-se registrar, ainda, a possibilidade de incidentes ocorríveis durante a vigência do contrato, como o de revisão de preços, denúncia do ajuste, prorrogação de vencimento, renovação do negócio etc. Se se estipula prazo certo para que estas faculdades se exerçam, o caso é de instituição de direitos formativos ou potestativos, cujo termo final acarreta decadência. O direito já nasce vinculado a uma duração certa, ao fim da qual, extingue-se automaticamente.[24]

Outro aspecto a ressaltar é que esses direitos potestativos, que nascem para os contratantes, quando não sujeitos a prazo certo têm como pressuposto a vigência do negócio principal. São acessórios ou incidentes somente admissíveis enquanto não extinto o vínculo negocial que lhes serve de suporte fático. Extinto este, extinta estarão também as faculdades que dele derivavam. Mesmo que, em casos especiais, se admita a revisão do contrato já extinto por decorrência de termo final de eficácia, o exercício tardio dessa faculdade se dará apenas para obter compensação eventual de prejuízos de um dos contratantes, e não para ressuscitar um contrato já inexoravelmente morto.

Nesta mesma perspectiva, a obtenção de prorrogação, legal ou convencional, para satisfazer débito parcial vencido durante a vigência do contrato extinto por termo final decadencial, não tem o condão de manter vivo o negócio principal. A novação ou o favor legal restringem-se à prestação prorrogada. Não interfere, pois, no termo final já ultrapassado e, tampouco, na consequente extinção do negócio jurídico principal. Pense-se na obrigação do administrador de prestar contas no último dia da gestão, e que obtém prazo adicional para desincumbir-se do encargo. Essa prorrogação, de maneira alguma, implicará ampliação do prazo da gestão já extinta. O gestor apenas terá obtido a relevação de sua possível mora, no tocante à obrigação acessória. Ficará, por exemplo, isento da cláusula penal prevista para a hipótese. Escapará tão somente da multa a que estaria sujeito pelo não cumprimento da obrigação acessória dentro do prazo de vigência do negócio principal. Nada mais do que isto.

6 – Prazos extintivos

Consideram-se prazos extintivos aqueles que provocam a extinção seja da pretensão (prescrição), seja da eficácia do próprio direito (decadência e resolução simples).[25]

A prescrição não atinge o direito contra cuja violação o titular não reagiu no tempo determinado em lei. O direito, não obstante violado, subsiste, tanto que o devedor pode renunciar aos efeitos da prescrição já consumada (Cód. Civil, art. 191), e o pagamento da dívida prescrita não corresponde a pagamento sem causa, nem autoriza a repetição de indébito (Cód. Civil, art. 882). O que se extingue é apenas a pretensão, isto é, o poder de exigir coativamente, do devedor, a prestação não reclamada no devido tempo (Cód. Civil, art. 189).

A decadência é algo maior do que a prescrição. Produz ela “l’estinzione del diritto in virtú del fatto oggettivo del decorso del tempo, esclusa, in genere, ogni considerazione relativa alla situazione soggettiva del titolare. La decadenza implica, quindi, l’onere di esercitare il diritto esclusivamente entro il tempo prescritto dalla legge”[26].

Da substancial diferença entre prescrição e decadência decorre que o prazo da primeira se acha sujeito a várias causas de interrupção ou suspensão, enquanto o da decadência é fatal, e somente pode ser impedido pelo “exercício do direito mediante o cumprimento do ato previsto”[27] (naturalmente, antes do termo final do prazo de vigência do direito subjetivo). É clara a alternativa que a lei opõe ao titular do direito sujeito a prazo decadencial: “o avvalersi del diritto entro il termine o perderlo”… Por isso, “non si applicano alla decadenza le regole sull’ interruzione e sulla sospensione della prescrizione”[28]. Ou seja, ou vale-se do direito antes do termo ou perdê-lo-á, pois não se aplicam à decadência as regras de suspensão ou interrupção da prescrição.

A par dos casos típicos de prescrição e decadência, existem, ainda, em grande número, direitos que trazem ínsita a causa de sua própria extinção e podem por isso mesmo tachar-se de direitos transitórios[29] (ou de duração temporária predeterminada). Entre estes casos figuram, segundo CAIO MÁRIO, os seguintes:

  1. Os direitos constituídos a termo (Cód. Civil, art. 131), os quais “desaparecem com o escoamento do prazo”;
  2. Os direitos subordinados à condição resolutiva (Cód. Civil, arts. 127 e 128), “cujo implemento importa no seu perecimento”;
  3. “Os direitos que se prendem indissoluvelmente à pessoa do sujeito”, os quais desaparecem quando perece o titular;
  4. E ainda “aqueles que se constituem como meios de obtenção de um fim determinado, os quais deixam de existir quando este é conseguido”[30].

Em todos esses exemplos – dos quais se sobressaem os negócios a termo – a característica comum é a previsão de um momento certo no qual a eficácia se extinguirá automaticamente, pondo fim à relação obrigacional ou ao vínculo jurídico existente.

Esse termo extintivo de eficácia é muito diferente do termo de adimplemento, porque aquele é causa ipso iure de cessação ou extinção da eficácia do direito ou da situação jurídica[31], enquanto o último apenas provoca a mora, que não é causa de extinção de eficácia, mas apenas causa autorizadora do cumprimento forçado e só, eventualmente, de rescisão contratual.

Na verdade, o desrespeito ao termo de cumprimento se presta apenas a ensejar o nascimento da pretensão oponível ao devedor inadimplente, e, por conseguinte, a fixação do termo inicial da prescrição (Cód. Civil., art. 189)[32]. Com efeito, a prescrição “começa a correr a partir do dia no qual o direito pode ser feito valer”[33].

São exemplos típicos de termo de eficácia aqueles impostos nos contratos de efeitos reais, como a de transferência ou constituição de direitos reais ou de concessão temporária de posse ou uso de coisas (direito real de usufruto, locação, comodato etc.). “L’eventuale termine disegna i limiti temporali del diritto ad ottenere la disponibilità del godimento del bene e del diritto al corrispettivo”[34].

Se, pois, o termo de eficácia é final, a sua verificação acarreta pura e simplesmente o efeito programado pelas partes do negócio jurídico, qual seja o de extinguir sua eficácia[35].

6.1 – Similitude entre termo final e decadência, no plano dos negócios jurídicos

Entre os fatos extintivos de direito e efeitos jurídicos, nosso Código Civil define a prescrição (art. 189) e, sem conceituá-la literalmente, prevê, ainda, a existência da decadência, à qual determina a não sujeição às “normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição” (art. 207). Prevê, também, que a decadência dos direitos subjetivos – que, segundo o léxico, é o “perecimento ou extinção de um direito” em virtude de decurso de prazo determinado para sua eficácia – possa decorrer tanto de regra legal como convencional (arts. 210 e 211).

Para o sistema de nosso Código, portanto, o prazo extintivo que não trate de pretensão (isto é, do poder de reagir contra a violação de um direito subjetivo), será sempre um prazo decadencial. Vale dizer:

“Quando se estipula, na lei ou no contrato, um prazo determinado para que a parte exerça um direito, a própria aquisição deste direito restou condicionada ao dado temporal. A decadência se insere na estrutura formativa do próprio direito”[36].

O sistema legal é de extrema singeleza: o prazo extintivo é de prescrição se se refere ao não exercício da pretensão; será de decadência, sempre que o direito subjetivo nascer com prazo certo para ser exercitado. Explica Miguel Reale, autor do Projeto que se converteu no atual Código Civil:

“Não haverá dúvida nenhuma: ou figura [o prazo extintivo] no artigo que rege a prescrição, ou então se trata de decadência”[37].

É certo que a decadência é concebida como mecanismo extintivo imediatamente aplicável aos direitos potestativos, mesmo porque estes não geram pretensão de exigir qualquer prestação do sujeito passivo, e assim jamais poderão recair no campo de aplicação do fenômeno da prescrição[38]. Mas não cabe dar-lhe um sentido que impeça de estender seus efeitos extintivos a quaisquer outros direitos subjetivos, que, a exemplo dos direitos potestativos, também estejam substancialmente vinculados a uma eficácia temporal rígida. Mesmo porque – é bom ressaltar – o Código, em momento algum, restringiu, a aplicação da decadência apenas aos direitos potestativos; de sorte que, aquilo que há de ocorrer sempre no terreno dos direitos potestativos poderá, também, em identidade de causa, se dar no âmbito dos demais direitos, desde que subordinados a um tempo certo de duração ou eficácia. Decadência, enfim, é sinônimo de morte, extinção de direito, por decorrência do tempo útil de vida pré-assinalado desde o seu nascimento.[39]

Nunca é pouco lembrar que a temporariedade é da substância das obrigações negociais, de modo que os direitos, faculdades, deveres e encargos que se originam das relações obrigacionais nascem, como estas, com o destino de extinguirem-se, fatalmente, num determinado momento, que corresponde ao chamado termo final da situação jurídica criada pelo negócio jurídico.

“Em resumo: prazos prescricionais são apenas os dos arts. 205 e 206 [do Código Civil]. Todos os demais que figuram no Código [e nos contratos], mormente os da Parte Especial, são decadenciais[40].

7 – Contagem dos prazos nos negócios sujeitos a termo final

Não raro se encontram doutrina e jurisprudência no sentido de que, mesmo sendo decadencial e peremptório, o prazo final previsto em lei ou contrato não se vence em dia feriado ou não útil[41].

Afirmações desse jaez decorrem, todavia, de uma visão restrita e por demais simplificadora das relações jurídicas sujeitas a prazos decadenciais. Os que assim pensam esquecem-se de que há mais de uma modalidade de termos de decadência:

  1. Há aqueles termos dentro dos quais se exige o exercício do próprio direito sujeito a decadência; e
  2. Há aqueles outros termos em que dentro (ou em função) do direito sujeito a decadência se impõem prazos para cumprimento ou prática de ato que se pode considerar como “singular”; trata-se de ato que não se pode considerar como correspondente ao conteúdo do direito básico, isto é, daquele direito cuja duração haverá de findar com o advento do termo final da decadência.

São casos como os de pagamentos de encargos periódicos, os de denúncia, de reserva ou ressalva etc.[42]. Aqui ocorrem prestações ou atos que a parte deve realizar, em prazos ou momentos certos, antes da extinção do direito submetido ao regime decadencial, e que, em regra correspondem a declarações de vontade receptícias. Ou seja, devem ser praticadas perante a contraparte ou por meio de agentes ou serviços públicos.

A inércia da parte, que não é relevante para a verificação do termo final, assume importância para o cumprimento de um ato “singular”, porque diante deles a extinção da faculdade atuaria como sanção. Em relação ao negócio básico, a decadência é apenas uma questão de duração do direito. Mas, relativamente aos atos singulares, a perda do poder de praticá-los operaria como pena ou sanção.

Nesse campo dos atos singulares sujeitos a prazos extintivos é que se pode cogitar de aplicar a regra geral de contagem de prazo que não se vence em dia não útil, tendo em vista a impossibilidade ou dificuldade de que a prestação pudesse ser nele efetivada. Não naqueles em que o efeito de acarretar o fim da situação jurídica se dá tão somente pelo decurso do tempo, sem depender de qualquer tipo de cooperação da contraparte ou de intermediação necessária de algum serviço público ou privado, a cargo de terceiros (publicidade registral ou serviços bancários, por exemplo).

É aqui que se torna importante a distinção entre termo de eficácia e termo de adimplemento. Se o caso é de termo de eficácia, a extinção do direito ocorre pelo simples decurso do prazo de vigência do direito, pouco importando o dia em que o vencimento se deu, seja ele útil ou festivo. Se o termo, porém, está atrelado a alguma prestação, ao obrigado haverá de ser assegurado que o prazo não se vença em dia não útil. É o que se passa, em regra, com os prazos processuais, que são contínuos e preclusivos, mas não se vencem em dias não úteis, para evitar que o litigante sofra redução do tempo disponível para desencargo do ônus processual (prejuízo irremediável, caso a faculdade tivesse de ser exercitada antes do dia festivo). Tem-se em conta que o ato processual não é praticável senão em face dos órgãos e agentes judiciais que não são acessíveis nos dias não úteis. É nesse sentido que, também no direito material, se estipula que o tempo de execução das prestações dura até último instante do dia final. E se “este é um dia festivo, o termo é prorrogado para o dia útil seguinte”[43].

Diversa é a situação do termo final de eficácia de um contrato ou de uma situação jurídica, que não pode ser confundido com “o termo das obrigações singulares que derivam do contrato”, termo esse regulado por normas específicas, e não pelas que disciplinam a duração e extinção da relação contratual[44]. O feriado, assim, é relevante para o termo das prestações singulares, e irrelevante para o termo de eficácia do contrato.

Em suma, pode-se afirmar que perante o contrato (e as situações jurídicas convencionais em sentido lato), há dois tipos bem diferenciados de termos:

  1. O termo de eficácia, que determina o momento inicial ou final de eficácia do negócio jurídico, como fonte de direito e obrigações recíprocas, e que nenhuma influência sofre em razão de sua coincidência (ou não) com dia útil ou festivo; e
  2. O termo de adimplemento, que determina o tempo de cumprimento das prestações que decorrem do negócio jurídico e cujo vencimento, salvo convenção em contrário, não recairá em dia não útil. O descumprimento do termo de adimplemento, no entanto, não se apresenta ordinariamente, como causa de extinção do contrato ou da situação jurídica existente entre as partes; gera, em regra, os efeitos da mora.

8 – A decadência e o termo final de seu prazo, segundo a jurisprudência

Sem embargo do reconhecimento universal de que as causas de interrupção ou suspensão dos prazos prescricionais não se aplicam à decadência, o STF chegou a decidir, por maioria, que, quando o direito potestativo houvesse de ser praticado por meio de ação judicial, não se poderia deixar de prorrogar, para o dia útil imediato, o vencimento que recaísse em dia no qual não houvesse expediente forense. Entendeu-se que a regra do art. 125, § 1º, do Código Civil de 1916 (art. 132, §1º, do Código atual) firmaria “princípio geral a ser obedecido”, de modo que “se o termo final de prazo recair em dia não útil, prorrogar-se-á até o primeiro dia útil seguinte, mesmo que seja de decadência dito prazo”[45].

Coube, porém, ao próprio Supremo Tribunal Federal alertar para a necessidade de rever sua velha tese sobre a prorrogabilidade do vencimento do prazo decadencial que recaia em dia não útil. E essa revisão se deu por meio de julgamento unânime do Plenário da Corte, assim ementado:

“AÇÃO RESCISÓRIA – PRAZO DECADENCIAL DE 2 (DOIS) ANOS – DIREITO MATERIAL – NÃO INCIDÊNCIA DA NORMA QUE PRORROGA O TERMO FINAL DO PRAZO AO PRIMEIRO DIA ÚTIL POSTERIOR.

1 – Por se tratar de decadência, o prazo de propositura da ação rescisória estabelecido no art. 495 do CPC não se suspende, não se interrompe, nem se dilata (RE 114.920, Rel. Min. Carlos Madeira, DJ 02.09.1988), mesmo quando o termo final recaia em sábado ou domingo.

2 – Prazo de direito material. Não incidência da norma que prorroga o termo final do prazo ao primeiro dia útil posterior, pois referente apenas a prazos de direito processual.

3 – Na espécie, o trânsito em julgado do acórdão rescindendo ocorreu em 1º de dezembro de 1999 (dies a quo), tendo o prazo decadencial se esgotado em 1º.12.2001 (sábado), ante o disposto no art. 1º da Lei 810/49 – ‘considera-se ano o período de doze meses contados do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte’. Ação rescisória protocolada nesta Suprema Corte apenas em 03 de dezembro de 2001 (segunda-feira), portanto, extemporaneamente.

4 – Decadência reconhecida. Processo extinto com base no art. 269, inc. IV, do Código de Processo Civil”[46].

O novo pronunciamento do STF foi unânime na acolhida da tese de que o prazo de decadência é fatal: “não se prorroga, é peremptório e vence no dia correspondente ao termo final, considerado o período fixado em lei” (voto do Rel. originário, Min. Marco Aurélio); “mesmo quando o termo final recaia em sábado ou domingo, como na espécie” (voto da Revisora Min. Ellen Gracie).

O prazo de decadência é sempre de direito material, ainda que o direito potestativo que lhe corresponde deva ser exercitado por meio de ação judicial. O que, afinal, está em jogo, no caso da rescisória, não é uma simples faculdade processual, mas é a subsistência, ou não, da situação jurídica substancial tornada imutável e indiscutível por força da coisa julgada material. Logo, o que se ataca não é senão a estabilidade e definição da situação de direito material assegurada ao respectivo titular.

Não se trata, portanto, de um direito potestativo diverso daquele que permite à parte prejudicada por vício de consentimento promover a ação de anulação do negócio jurídico. O prazo para propô-la é decadencial e de natureza material (Cód. Civil, art. 178), sem embargo de o exercício do direito potestativo reclamar sentença judicial (Cód. Civil, art. 177)[47].

Sendo indiscutível tratar-se de prazo assinalado para o exercício de direito material, a decadência, que se origina da ultrapassagem do seu termo final, consiste, precisamente, “no esgotamento de um direito potestativo pelo decurso do tempo”. Daí porque não se é de admitir “que haja, em regra, interrupção ou suspensão de prazo decadencial”, tendo em conta que o direito potestativo de alguém sempre põe em risco direito já estabelecido em favor de outrem[48].

Melhor explicando, Gustavo Neves, ressalta que não se aplicam à espécie as causas que suspendem ou interrompem a prescrição, e “não há nem admissão da prorrogação do exercício de prazo decadencial para o primeiro dia útil subseqüente”. Aduz mais:

“A decadência historicamente representa um meio de libertação diante de um direito potestativo exercido diante de um sujeito passivo, que permanece em estado de sujeição (v. art. 207). O fundamento da decadência é a intangibilidade das esferas individuais que deve ser preservada”[49].

O STJ, que tem admitido a prorrogação do vencimento do prazo de propositura da rescisória, adotou posição contrária, ao tratar da extinção do contrato por força do implemento do termo final de sua vigência

“CIVIL – LOCAÇÃO – AÇÃO RENOVATÓRIA – TERMO FINAL DO CONTRATO – PRORROGAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – ART. 125, § 1º, CC/1916. INAPLICABILIDADE.

I – Consoante entendimento manifestado por esta Corte, a data definida no contrato de locação para seu término, prevalece sobre qualquer outra forma de contagem do lapso temporal de vigência do pacto.

II – O art. 125, § 1º, do Código Civil de 1916, estabelece que se o vencimento ‘cair em dia feriado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte dia útil.’ Não há determinação no sentido de que se o termo final de um negócio jurídico cair em dia não útil, haverá a prorrogação de sua eficácia”[50].

O STJ, nesse acórdão, fez bem a distinção entre prazo de eficácia do contrato e prazo de cumprimento de prestação. A este, e não àquele, é que a lei admite a prorrogação de vencimento para o dia útil subsequente[51].

De fato, é de se ter como provisória, e não definitiva, toda eficácia que se apresenta como resolúvel pela possibilidade de “ser desfeita pelo implemento de condição resolutiva ou alcance do termo final[52]. O termo final, nessa ordem de ideias, provoca a extinção do direito que do contrato nascera para a parte. Extinto o vínculo negocial, desaparecem os direitos que temporariamente encontraram fonte no referido vínculo.

Se durante a vigência de um determinado vínculo jurídico, estabelece-se um direito potestativo para uma das partes (por exemplo: direito de denunciar ou prorrogar o contrato), o prazo que para o respectivo exercício se estabelece é, necessariamente, decadencial, mesmo quando haja de ser exercitado judicialmente, como já decidiu o STF (AR 1.681/CE). Vale a pena relembrar a lição de Agnelo Amorim Filho, a respeito de direitos potestativos, como o de preferência, o de rescindir a sentença de mérito, o de anular contratos etc.:

“Assim, pode-se dizer, com relação aos direitos potestativos subordinados a prazo, que o prazo não é fixado, propriamente, para a propositura da ação, mas para o exercício de direito… O que intranquiliza não é a possibilidade de ser proposta a ação, mas a possibilidade de ser exercido o direito. Assim, extinguir a ação, e deixar o direito sobreviver (como ocorre na prescrição), de nada adiantaria, pois a situação de intranquilidade continuaria de pé.

Infere-se, daí, que quando a lei fixa prazo para o exercício de um direito potestativo, o que ela tem em vista, em primeiro lugar, é a extinção desse direito, e não a extinção da ação. Esta também se extingue, mas por via indireta, como consequência da extinção do direito”[53].

 8.1 – Força do termo final

Com o advento do termo final, extingue-se o vínculo negocial, ipso iure. Não há de se pretender dilatação do prazo de eficácia da relação jurídica mantida entre as partes, a pretexto de que o vencimento recaiu em dia não útil. A exaustão do vínculo jurídico, na espécie, não é fato que dependa de ato das partes ou que reclame cooperação entre elas. É fenômeno que se passa exclusivamente no plano do direito. É algo muito diferente do ato de realizar o cumprimento da prestação devida pelo contratante, que se materializa no pagamento (ato bilateral, a envolver o solvens e o accipiens). Por isso é que a regra de prorrogação do prazo de adimplemento não tem aplicação ao prazo de eficácia.

Parece óbvio que a posse e desfrute de um bem contratados, v.g., pelo prazo de dez dias, não haverão de se prorrogar por mais um ou dois dias simplesmente por o termo final recair num sábado ou num domingo. Vencido o prazo ajustado, extingui-se a posse cedida e o objeto do contrato tem de achar-se liberado, sob pena de tornar-se, o contratante, responsável por esbulho. Da mesma forma, quem aluga uma casa de praia por cinco dias, não tem direito de ocupá-la na segunda- feira, pelo fato de o quinto dia do prazo contratual ter recaído no domingo. Tampouco o seguro contratado por tempo certo pode ter sua cobertura ampliada por um dia, quando o vencimento recair em dia não útil. E assim por diante.

9 – Conclusões

Em suma:

  1. A duração da situação jurídica criada por um contrato ou outro negócio jurídico, extingue-se definitivamente com o advento do termo final, a que a convenção se acha subordinada.
  2. Salvo previsão especial de lei ou de convenção expressa, o termo final, pondo fim à situação jurídica estabelecida entre as partes, acarreta necessariamente a extinção dos direitos potestativos ou faculdades que pressuponham a vigência (ou eficácia) da relação negocial.
  3. Todos os poderes que correspondiam a faculdades inerentes ao vínculo contratual, que não foram exercitados durante a vida do negócio jurídico, extinguem-se juntamente com a cessação de eficácia deste. A decadência de um acarreta ipso facto a decadência dos outros, é, dos direitos potestativos deles originados.
  4. O efeito da exaustão do prazo de caducidade, como é o de vigência do contrato ou da autorização ou concessão administrativa, “produz-se automaticamente, vale dizer, uma vez transcorrido, o poder, ação ou direito que seja, se extingue ipso iure, e não é necessário que tal seja alegado pelo interessado, já que os Tribunais o apreciarão de ofício”[54].
  5. A regra de que o vencimento, quando recai em dia não útil, se prorroga para o primeiro dia útil subsequente (Código Civil, art. 132, § 1º), aplica-se aos termos de adimplemento (correspondentes aos prazos para cumprir prestações estatuídas em negócios jurídicos), e não aos termos de eficácia (correspondentes ao tempo de duração da situação jurídica nascida do contrato ou de outro negócio jurídico qualquer). A prorrogação de que se cuida se dá em favor de quem não consegue realizar a prestação devida no dia do vencimento do prazo previsto, e tem como objetivo impedir a mora debitoris, e não evitar o perecimento de direito que deve acontecer por simples decurso do tempo, sem depender de ação ou omissão do respectivo titular.
  6. Não é prazo processual, mas material, o que prefixa a duração do vínculo negocial e das faculdades ou direitos dele derivados, ainda que devam ou possam ser exercidos através de processo judicial. A esse tipo de direito ou faculdade não se aplicam as regras especiais dos prazos genuinamente processuais, no que se relaciona com as possíveis prorrogações de vencimento.
  7. Somente são prazos processuais aqueles que se praticam no processo, com o objetivo de produzir efeito processual[55]. Não se pode, portanto, tratar como prazo processual aquele que nasce fora do processo, para delimitar o tempo dentro do qual será possível juridicamente atacar uma situação de direito material revestida da imutabilidade e indiscutibilidade gerada pela coisa julgada material. A eficácia da coisa julgada, in casu, embora assentada sobre um provimento judicial, só se aperfeiçoa com o encerramento definitivo da relação processual; e seu objetivo é pacificar, de forma plena, a situação jurídica de direito material disputada entre os litigantes. Quando, portanto, passa a imperar a autoridade da res iudicata, não há mais processo, e o plano em que essa autoridade se faz valer pertence, por inteiro, ao direito material.
  8. a pretensão de rescindir uma sentença revestida da autoridade da coisa julgada material não é substancialmente diversa daquela voltada para a anulação de um negócio jurídico, ou para a rescisão de um contrato afetado por descumprimento. Pouco importa que, nesses casos, a pretensão rescisória tenha de ser manejada por via judicial. O que se exercita é pretensão de natureza material, e não faculdade meramente relacionada com o processo ou com o procedimento. Por isso, é que o prazo para propor a ação rescisória, como o da ação anulatória de negócio jurídico, não pode ser tratado sob o regime dos prazos processuais. Há de prevalecer, portanto, como já acentuou o STF, o regime dos prazos decadenciais, sem embargo de o direito potestativo material (ou faculdade) depender da via judicial para seu exercício (AR 1.681/CE).

[1] Pressuposto de fato é “o conjunto daqueles requisitos que o ordenamento jurídico reconhece como fundamento de uma consequência jurídica”, sejam eles atos humanos, voluntários ou não, tais como declarações de vontade ou atos lícitos, eventos da natureza ou atos ilícitos (Cf. ENNERCCERUS, Ludwig; KIPP, Theodor e WOLFF, Martin. Tratado de Derecho Civil. 2. ed. Barcelona: Ed. Bosch, 1950, v. 2, § 126, p. 1-5).
[2] “Os negócios  jurídicos entre vivos, sem prazo, são exequíveis desde logo, salvo se a execução tiver de ser feita em lugar diverso ou depender de tempo” (Código Civil, art. 134).
[3] O Código Civil, de maneira correta, classifica como inicial e final o termo, e não o prazo (art. 135). No entanto, “o alargamento conceitual, em prejuízo da técnica, fez com que, outrora, se empregassem como sinônimos, prazo e termo, esse por aquele. É o que acontecia nas Ordenações Filipinas (III, 20, 44) e no Regulamento 737, de 1850” (BORGES, Paulo Tormin. Decadência e prescrição. São Paulo:  Pro-Livro, 1980, p.22).
[4] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado, Atualizado por Marcos Bernardi de Mello e Marcos Ehrhardt Jr. São Paulo: Ed. RT, 2013, T. V, §549, p.243.
[5] Prazo, na lição de Clóvis, “é o lapso de tempo decorrido entre a declaração da vontade e a superveniência do termo” (SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de Direito Civil. 8. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos Editora, 1996, vol. I, n. 351, p. 499; BARROS MONTEIRO, Washington de. Curso de Direito Civil. 39. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, vol. I, p. 277). “O termo, todavia, distancia-se do prazo, justamente nisto: enquanto aquele é a marca, o ponto, o momento, o elemento periférico do tempo, o prazo é o elemento central, o conteúdo… E, como o prazo pode ter início desde já ou no futuro, podemos defini-lo como o tempo que medeia entre dois termos ou entre a declaração de vontade e um termo” (        BORGES, Paulo Tormin. Decadência e prescrição, cit., p. 22)
[6] “Termo inicial (dies a quo) é o que suspende o exercício de um direito, ou, ainda, é o momento em que a eficácia de um ato jurídico deve começar” (RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. 29. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 1999, vol. I, n. 122, p. 255). “Termo final (dies ad quem) é o que faz cessar o direito criado pelo ato” (BARROS MONTEIRO, Washington de. Op. cit. p. 278).
[7] “Termo final é aquele em que o efeito, que se vinha produzindo, deixa, em dies certus, de produzir-se” (PONTES DE MIRANDA, Tratado cit, V, §553, p. 256).
[8] PONTES DE MIRANDA, op.cit., loc. cit.
[9] PONTES DE MIRANDA, Tratado cit. V, §593, p. 412.
[10] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, v. I, n. 81, p. 468.
[11] PONTES DE MIRANDA, Tratado cit. V, §593, p. 413.
[12] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições cit., I, n. 81, p. 469.
[13] Idem, ibidem.
[14] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições cit., I, n. 81, p. 469-470.
[15]  PONTES DE MIRANDA, Tratado cit., V, §593, p. 413.
[16] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições cit., I, n. 81, p. 470. A respeito desses mesmos direitos, PONTES DE MIRANDA fala em “direitos que se extinguem com o exercício”. Explica que “exercê-los é esgotá-los. É o que se passa com os direitos formativos, os direitos de garantia e os direitos de crédito. Satisfeitos, extinguem-se. Dentre eles, uns têm pretensão a prestação e ação; outros exercem-se por si; outros, acessórios, acabam com o direito principal, (…) são direitos exauríveis, à diferença do direito de propriedade, das servidões e outros que não se exaurem, ou direitos extrínsecos, em vez dos intrínsecos, que têm em si-mesmos, na imediatidade do seu objeto, o seu fim” (Tratado cit., V, §593, p. 414-415).
[17] PONTES DE MIRANDA, Tratado cit., V, §592, p. 416.
[18]  O prazo é final ou extintivo (dies ad quem) “quando nele encontra fim a produção de efeitos do negócio jurídico”  (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 20. ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2004, vol. I, n. 99, p. 575). Estão na categoria de direitos transitórios “os que se constituem a termo (Cód. Civil, art. 131), e desaparecem com o escoamento do prazo” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op cit. n. 81, p. 470). O termo final, sendo causa de extinção do vínculo jurídico, acarreta a chamada “extinção do direito”, ou seja, “o seu fim, a sua morte, o seu desaparecimento” (idem, p. 468).
[19]  “O termo final não destrói propriamente a relação jurídica, mas põe fim aos seus efeitos” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op cit. n. 99, p. 576). “Assim, na hipótese de termo final, os efeitos cessam com a produção do termo” (ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil – Teoria geral. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2003, vol. II, n. 193, p. 357).
[20] A essencialidade resulta, normalmente, da própria natureza do contrato (caso em que se fala em “termo essencial objetivo”); mas pode também ser estabelecido “por convenção das partes” (caso de “termo essencial convencional”) (OLIVEIRA, Eduardo Ribeiro de. Comentários ao novo Código de Processo Civil, 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2012, v. II, p. 360; AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Extinção dos contratos por incumprimento do devedor, 2. ed., Rio de Janeiro: AIDE, 2003, p. 118-119
[21] ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil – Teoria geral cit. v. II, p. 357.
[22]  O prazo, na espécie, conduzindo a um termo de adimplemento, sujeita-se à regra geral de que o vencimento da obrigação que cai em feriado prorroga-se para o primeiro dia útil seguinte (Código Civil, art. 132, §1º). Com essa prorrogação, facilita-se o cumprimento da prestação devida, impedindo que a mora ocorresse a partir de um momento em que o devedor não teria como realizar o pagamento da dívida.
[23] Portanto, será possível submetê-los à prorrogação para o primeiro dia útil, quando o termo ajustado recair em feriado. Essa prorrogação, todavia, por referir-se a obrigação secundária, em nada repercutirá sobre o termo final de eficácia, a que se subordina a duração do negócio principal, como um todo.
[24] É indiferente que o termo de decadência recaia, ou não, em dia útil.
[25] “… é como prazo, prazo extintivo, que se compreende a decadência, e, com ela, os institutos afins. Todos os prazos cujo curso obedecido o critério legal, importa em extinção no campo jurídico, podem ser chamados prazos extintivos, englobados assim em uma só e grande família” (BORGES, Paulo Tormin. Decadência e prescrição cit., p. 23).
[26] TORRENTE, Andrea; SCHLESINGER, Piero. Manuale di diritto privato, 16 ed., Milano: Giuffrè, 1999, § 88, p. 147.
[27] Idem, ibidem.
[28] GERI, Lina Bigliazzi et al. Diritto Civile cit. Torino: UTET, 1987, vol. 1.1, n. 89. p. 407, e n. 90, p. 408.
[29] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 20ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, v. I, nº 81, p. 470.
[30] PEREIRA, Caio Mário da Silva, op. cit., loc. cit.
[31] “O titular de direito submetido a termo final pode exercê-lo, como se fora puro e simples. Chegando a termo, porém, ele se extingue” (BARROS MONTEIRO, Washington de. Curso de Direito Civil. 39. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2003, vol. I, p. 279). Termo final “é o que da término a um direito criado pelo contrato e até então vigente. Em oposição ao termo inicial, poder-se-ia dizer que é o momento em que a eficácia do ato jurídico deve terminar”. Por isso, também se denomina termo resolutivo ou extintivo” (RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil.  29 ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 1999, vol. I, n. 122, p. 255).
[32] “Qualora i contraenti, contemplando un evento futuro, abbiano ad esse correlato non l’efficacia del vincolo negoziale, ma soltanto il tempo dell’adempimento, resta esclusa l’invocabilità dei principi inerenti alla condizione o al termine quali elementi accidentali del neg., e rimane applicabile la disciplina sul tempo dell’adempimento…” (CIAN, Giorgio; TRABUCCHI, Alberto. Commentario breve al Codice Civile, 4. ed., Padova: CEDAM, 1996, p. 1.183.
[33] GERI, Lina Bigliazzi; BRECCIA, Umberto; BUSNELLI, Francesco D.; NATOLI, Ugo. Diritto Civile. 1.1: Norme, soggetti e rapporto giuridico. Torino: UTET, 1987, vol. 1.1, n. 81 p. 390.
[34] PERLINGIERI, Pietro. Manuale di diritto civile, 3. ed., Napoli: Edizioni Scientifiche Italiane, 2002, p. 240.
[35] GALLO, Paolo. Diritto privato, 3. ed., Torino: G. Giappichelli Editore, 2002, p. 432.
[36] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil, 4. Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2008, v. III, t. II, nº 399, p. 417.
[37] REALE, Miguel. O projeto do novo Código Civil, 2. Ed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 10-11.
[38] Os direitos potestativos “nada mais são do que poderes ou faculdades do sujeito de direito de provocar a alteração de alguma situação jurídica. Neles não se verifica a contraposição de uma obrigação do sujeito passivo a realizar certa prestação em favor do titular do direito. A contraparte simplesmente está sujeita a sofrer as consequências da inovação jurídica. Por isso,  não cabe aplicar aos direitos potestativos a prescrição: não há pretensão a ser extinta, separadamente do direito subjetivo; é o próprio direito potestativo que desaparece, por completo, ao término do prazo marcado para seu exercício” (THEODORO JÚNIOR, Humberto, Comentários ao novo Código Civil, 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2008, vol. III, t. II, n. 399, p. 416). Diante de uma faculdade, como a de anular um negócio jurídico, não se pode entrever um direito passível de violação pela parte que haverá de suportar as consequências da invalidação (cf. MOREIRA ALVES, José Carlos. A parte geral do Projeto de Código Civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1986, p. 155).
[39] “Sabe-se que a prescrição é o encobrimento dos direitos análogos à pretensão; enquanto a decadência trata da extinção dos direitos potestativos” (MARTINS-COSTA, Judith. O projeto de Código Civil brasileiro: Em busca da “ética da situação”. Revista Jurídica, v. 282, p. 38).
[40] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários cit., nº 400, p. 421.
[41] GERI, Lina Bigliazzi, et al anotam, por exemplo, que a respeito das regras traçadas sobre contagem do prazo de prescrição, há uma tendência de reconhecer-lhes o caráter de regra geral, de sorte que, mesmo no caso de decadência, o vencimento do prazo em feriado acarretaria prorrogação para o dia útil seguinte (Diritto Civile – 1.2. Fatti e attigiuridici. Torino: UTET, 1987, vol. 1.2, n. 137, p. 777) .Entre nós, a jurisprudência do STF, que mais antigamente decidira pela sujeição da decadência às regras ordinárias do Código Civil sobre contagem dos prazos em geral (ERE 86.741) ,em data mais recente reviu seu posicionamento, para assentar que, salvo nos prazos processuais, a decadência, que é fenômeno de direito material, flui de maneira peremptória e fatal até atingir o termo final extintivo, sem cuidar de que este caia em dia útil ou não útil (STF, AR 1.681).
[42] PANZA. Giuseppe. Verbete “Decadenza nel diritto civile”. Digesto delle discipline privatistiche – Sezione Civile, Torino: UTET, 1985, v. V, p. 134.
[43] GALGANO, Francesco. Il contratto. Padova: DECAM, 2007, p. 77.
[44] GALGANO, Francesco. Il contratto cit., p. 201-202.
[45] STF, Pleno, ERE 86.741/BA, Rel. Min. Oscar Corrêa, ac. 16.06.1982. Ficaram vencidos os Ministros Néri da Silveira, Alfredo Buzaid, Moreira Alves e Djaci Falcão (RTJ 108/1.085). Antes, o mesmo STF já havia decidido, por sua 1ª Turma, no mesmo processo, que, mesmo sendo peremptório ou de caducidade, “mas recaindo num dia em que não funciona o foro por causa de fechamento do fórum, esse prazo é adiável até o primeiro dia útil seguinte” (RE 86.741/BA, Rel. Min. Antônio Neder, ac. 02.12.1977, DJU 03.03.1978, RTJ 85/1.019). Na mesma linha de pensamento, o TJSP, em acórdão de 23.04.1987, assentou que “se não é possível dilatar o prazo de decadência, também não é possível encurtá-lo e, dessa forma, quando recair um feriado o último dia do vencimento, a solução mais justa é a aplicação da regra geral…. Além do mais, o art. 125, § 1º, do CC prevê expressamente a referida prorrogação, sem distinguir entre prazo de prescrição e de decadência” (Ap. Civ., 115.749-2, Rel. Des. Oliveira Andrade, RT 621/102). O STJ não se desviou de tal entendimento: “Recaindo último dia do prazo bienal para o ajuizamento de ação rescisória durante férias forenses, prorroga-se, até o primeiro dia útil, esse lapso temporal” (Corte Especial, EREsp 667.672/SP, Rel. Min. José Delgado, ac. 21.05.2008, DJe, 26.06.2008, No mesmo sentido: STJ, 2ª Seção, AR 3.291/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, ac. 10.03.2010, DJe 12.04.2010; STJ, 3ª Seção, EDcl na AR 703/SP, Rel. Min. Vicente Leal, ac. 08.08.2001, DJU 27.08.2001, p. 220). Diante desses reiterados e uniformes pronunciamentos, consideramos, em nossos Comentários ao novo Código Civil (Rio de Janeiro: Forense, 2003. V. III, t. II, p. 364), como tranquila a jurisprudência exposta.
[46] STF, Pleno AR 1.681-8/CE, Rel. p/ ac. Ellen Grecie, ac. 27.09.2006, DJU 15.12.2006, p. 81. O relator Min. Marco Aurélio ficou vencido apenas na preliminar acerca do conhecimento ex officio da decadência. No mérito, a decadência foi reconhecida e decretada à unanimidade.
[47] “Todo prazo fixado contratualmente para resilição, por exemplo, traz no bojo a ocorrência de uma hipótese de decadência, ou seja, o prazo para o exercício de um direito potestativo” (NEVES, Gustavo Kloh Müller. Prescrição e decadência no direito civil. Rio de Janeiro: ed. Lumen Juris, 2006, p. 123.
[48] NEVES, Gustavo Kloh Müller. Op. cit., p. 123.
[49] NEVES, Gustavo Kloh Müller .Op. cit., loc.cit.
[50] STJ, 5ª T., REsp 616.022/SC, Rel. Min. Felix Fischer , ac. 15.04.2004, DJU 16.08.2004, p. 279.
[51] Lamentavelmente, há casos em que não se fez a necessária distinção, admitindo a prorrogação do termo final do contrato, para o primeiro dia útil, quando cair em dia não útil (STJ, 2ª T., REsp 710.246/MG, Rel. João Otávio De Noronha., ac. 01.03.2005, DJU 18.04.2005, p. 300).
[52] MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico – 1ª Parte – Plano da eficácia, 3ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 49.
[53] AMORIM FILHO, Agnelo. Critério científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis. RT, v. 300, p. 11-14, republicado em Doutrinas essenciais. Direito Civil. Parte Geral, org. por Gilmar Ferreira Mendes e Rui Stoco. São Paulo: Ed. RT, 2011, p. 42-43.
[54] ALBALADEJO, Manuel. Derecho civil – I – Introducción y parte general. 14 ed. Barcelona: Bosch, 1996, v. II, § 108, p. 508-509. Esclarece o autor: “La caducidad significa que algo – generalmente una facultad o un llamado derecho potestativo, tendentes a modificar una situación jurídica – nace con un plazo de vida, y que, pasado éste, se extingue. Se trata pues, de que la facultad o el derecho que sea es de duración limitada” (op. cit., § 108, p. 506).
[55]  CALMON DE PASSOS, José Joaquim. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2002, n. 38, p. 53.
Fonte: http://genjuridico.com.br/2014/12/11/ensaio-sobre-decadencia-prazo-termo-final-e-extincao-de-eficacia-do-negocio-juridico/?utm_source=Consumidores+engajados+-+Site+da+M%C3%A9todo&utm_campaign=78b69e181c-Newsletter_27_11_201411_28_2014&utm_medium=email&utm_term=0_6262bad285-78b69e181c-180368993