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terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A teoria da imprevisão e a distinção entre contratos civis e comerciais


 O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou a aplicação da teoria da  imprevisão a contratos de venda futura de soja a preço certo,  celebrados no início dos anos 2000 por um produtor rural goiano.
 Seguindo voto do ministro Antonio Carlos Ferreira, a Turma entendeu  que a alta no preço do produto, em razão da variação cambial ocorrida  à época, não tornou o cumprimento do contrato excessivamente oneroso  para o produtor; apenas reduziu o lucro que ele poderia ter obtido, de  forma que não é possível a revisão do contrato pelo Poder Judiciário.
 A teoria da imprevisão é adotada pelo artigo 478 do Código Civil de  2002 e possibilita que uma parte do contrato seja exonerada de suas  obrigações quando fatos supervenientes, extraordinários e  imprevisíveis, tornarem sua prestação muito onerosa, com vantagem  excessiva para a outra parte.
 Alguns casos semelhantes, envolvendo soja negociada no mercado futuro  pelos produtores de Goiás, já foram julgados no STJ. Os vendedores  queriam que o Judiciário declarasse os contratos nulos, argumentando  que a variação cambial ocorrida em 2002, por conta de eventos como a  iminência da Guerra do Golfo e as eleições presidenciais, elevou as  cotações do produto. Não tiveram sucesso.
 No caso relatado pelo ministro Antonio Carlos Ferreira, o produtor  rural pretendia a resolução de contratos celebrados com a empresa  Cargil Agrícola S.A. O pedido foi atendido na primeira e na segunda  instância, ao entendimento de que esses contratos estavam desprovidos  do princípio da boa-fé objetiva e do necessário equilíbrio econômico.
 No entanto,  segundo a Quarta Turma, a variação cambial que alterou a  cotação da soja não caracterizou um acontecimento extraordinário e  imprevisível. "As partes contratantes conhecem o mercado em que  atuam", disse o relator, lembrando que são profissionais do ramo e  sabem que as flutuações de preço são possíveis nesse tipo de negócio.
 Ao votar a favor do recurso interposto pela Cargil, o ministro  destacou que os contratos empresariais não podem ser tratados da mesma forma que os contratos de consumo ou os contratos cíveis em geral, os  quais admitem maior dirigismo contratual, com a conseqüente  relativização dos princípios da autonomia da vontade e da força  obrigatória das avenças.
 Ele lembrou que o direito civil e o direito empresarial submetem-se a  regras e princípios próprios, ainda que ambos sejam ramos do direito  privado. "O fato de o Código Civil de 2002 ter submetido esses  contratos às mesmas regras gerais não significa que sejam  essencialmente iguais", disse o ministro.
 "Nos contratos empresariais, dada a simetria natural que há entre as  partes contratantes, a situação é diferente. Não se pode tratá-los da  mesma forma que os demais contratos de direito privado, tais como os  contratos de trabalho, os contratos de consumo ou mesmo os contratos  entre particulares", acrescentou.
 O caso analisado pela Quarta Turma tem peculiaridades que impedem a  aplicação da teoria da imprevisão, segundo o relator. Primeiro, os  contratos em discussão não são de execução continuada ou diferida, mas contratos de venda de coisa futura, a preço fixo; além disso, a alta  do produto não tornou a prestação excessivamente onerosa para uma das  partes, que apenas deixou de lucrar mais com ela; finalmente, a  variação cambial que alterou a cotação da soja não foi evento  extraordinário e imprevisível no mercado.

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